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escala temporal, a descontinuidade política requer, em vários momentos, que se retome etapas ou
se comece novamente o trabalho de gestão integral a cada troca de gestão política. No caso do
“Mulheres de São Carlos Construindo Autonomia”, houve um hiato de quase 2 anos entre a etapa
teórica e a prática por conta de dificuldades sofridas durante a licitação de compras de
equipamentos e materiais para o espaço físico do curso, e também de uma descontinuidade política
com a troca da gestão da Prefeitura Municipal de São Carlos em 2012. As aulas práticas foram
retomadas somente no ano de 2015, quando eram para ter ocorrido logo em seguida ao término
das aulas teóricas. Isso acarretou em uma grande taxa de evasão de alunas, das 200 ingressantes,
somente 40 participaram do último módulo. Acredita-se que a pausa desmotivou as alunas e levou-
as a procurar outras formas de inserção mais imediata no mercado de trabalho.
Uma particularidade do programa “Mulheres de São Carlos Construindo Autonomia” é o recorte de
gênero que faz. A bibliografia recente apresenta críticas ao modelo como o programa federal, no
geral, foi implantado. Oliveira, em artigo de 2013 “O programa Mulheres Construindo Autonomia na
Construção Civil: entre a agenda de gênero e a agenda neoliberal” discute como o programa,
mesmo trazendo uma inovação no campo das políticas de qualificação profissional para mulheres
por romper com a tradição de qualificação em nichos feminizados, incorpora as demais diretrizes
dos programas sociais voltados para as mulheres, tais como focalização na pobreza extrema e a
capacitação para ocupação de postos preconizados e flexibilizados, regidos pela lógica da agenda
neoliberal. Quanto a isso, o projeto contemplado pelo edital federal e implantado em São Carlos
traz uma inovação, que é a proposta de empreendimento social que seria formado pelas alunas a
partir do final do curso. A ideia da criação e consolidação de um circuito sócio produtivo local e de
uma forma alternativa de arranjo social para o trabalho é justamente uma oportunidade de maior
autonomia e de emancipação social frente ao contexto econômico neoliberal. Entretanto,
fragilidades e insuficiências na etapa de assessoramento para o processo de formação do
empreendimento fizeram com que este, ao final do curso, ainda não tivesse sido encaminhado.
O CEVE também desenvolve a criação e consolidação de circuitos sócio produtivos locais através
do trabalho. Uma ação nesse sentido é a linha de microcréditos no valor de 5000 a 6000 pesos,
voltada para empreendimentos produtivos de caráter domiciliar, inicialmente pensado para a área
de construção civil, mas posteriormente ampliado para outros meios de produção como manufatura
de costura, doces caseiros, etc. Sob a ótica da gestão integral, nos processos de transferência
tecnológica que desenvolve ainda estimula o fortalecimento do sistema produtivo local (micro e
pequenos empreendimentos, cooperativas de trabalho, associações de usuários, etc.) e o potencial
de geração de empregos e fontes de renda através da valorização dos recursos materiais e
humanos da comunidade alvo no planejamento das etapas. Um obstáculo surgido para o sucesso
desse tipo de empreendimento é a possível falta de sustentabilidade das pequenas e
microempresas geradas a partir da perda ou extinção dos fundos estatais que financiam os projetos
habitacionais que lhes deram origem. A motivação inicial para a auto-organização é algo muito
importante para maior chance de sucesso do empreendimento.
No contexto atual da economia, muitas iniciativas de qualificação profissional tratam a questão do
emprego não como uma “questão social”, mas como uma questão de natureza individual, cabendo
ao trabalhador individualmente adequar-se às exigências do mercado e tornar-se “empregável”.
Isso gera um cenário em que coexistem, por um lado, uma valorização do trabalho qualificado nas
primeiras escalas da cadeia produtiva, e por outro, uma parcela desvalorizada e mal paga dos
trabalhadores das escalas mais baixas da própria cadeia (SILVA, 2007). A consolidação de circuitos