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confrontando as necessidades de sobrevivência e de reprodução do modo de vida dos produtores
com os argumentos da proteção ambiental. Nesse sentido, algumas soluções adotadas para
minimizar os conflitos, apesar dos avanços normativos sobre a matéria, ainda tendem a adotar
métodos conservadores que afrontam direitos sociais, como as remoções dos assentamentos que
resultam em desabrigo das suas populações, ou a proibição da continuidade das atividades
agrícolas, ou imposição de critérios muito restritivos para sua continuidade, podendo esta última
resultar na expulsão dos produtores e na supressão da atividade econômica que garante sustento
das suas famílias. Para as áreas agrícolas que se encontram em situação de irregularidade, a
situação se apresenta ainda mais grave, considerando que a ausência do título de posse da
propriedade os torna ainda mais vulneráveis frente a políticas de remoção. No entanto, a depender
dos atores envolvidos, é possível encontrar soluções que dialoguem com o princípio da justiça
socioambiental, como as políticas de reconversão, isto é, políticas voltadas para promover as
práticas da agricultura orgânica ou agroecológica , que geram menos impactos socioambientais.
Nesse sentido, há projetos como o “Amigo Verde”, detalhado mais adiante, que buscam substituir
a produção convencional pelo modo orgânico, de modo a minimizar ou eliminar os danos sobre o
meio ambiente, assegurando a permanência dos produtores agrícolas no lugar.
Desde a perspectiva normativa, a própria Legislação Federal pode fornecer referências para a
ocupação de áreas ambientalmente protegidas por atividade agrícola, mais especificamente, dos
dois tipos de áreas principais que devem ser protegidas segundo o marco legal brasileiro: as Áreas
de Preservação Permanente (APP) e as Unidades de Conservação (UC). A APP é definida pelo
Código Florestal Brasileiro, Lei Federal Nº 12.651/2012, como sendo uma “área protegida, coberta
ou não por vegetação nativa, com a função ambiental de preservar os recursos hídricos, a
paisagem, a estabilidade geológica e a biodiversidade, facilitar o fluxo gênico de fauna e flora,
proteger o solo e assegurar o bem-estar das populações humanas” (BRASIL, 2012, Art. 3º, II). São
consideradas APPs: faixas marginais de cursos d’água naturais perenes e intermitentes, áreas no
entorno dos lagos e lagoas naturais, áreas no entorno dos reservatórios d’água artificiais
(decorrentes de barramento ou represamento de cursos d’água naturais), áreas no entorno das
nascentes e dos olhos d’água perenes, encostas ou partes destas com declividade superior a 45°,
veredas, dentre outras, com condições específicas (BRASIL, 2014, Art. 4º).
O Artigo 61 do Código Florestal autoriza a continuidade de atividades agrossilvipastoris, de
ecoturismo e de turismo rural em APPs, em áreas rurais consolidadas até 22 de julho de 2008. O
Código define ainda a obrigatoriedade de recomposição de faixas marginais ao longo de cursos
d’água naturais, variando as suas dimensões de acordo com o tamanho da propriedade, medida
em módulos fiscais : quanto maior a propriedade, maior a área destinada à recomposição de faixas
marginais. Contudo, a permissão da continuidade de atividades agrícolas em APPs pelo Código é
especificada apenas para áreas rurais, não havendo qualquer menção à atividade agrícola
desenvolvida em meio urbano. Para este meio, o Código Florestal estabelece apenas a
possibilidade de regularização fundiária de interesse social e específico (Arts. 64 e 65), exigindo