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Na literatura sobre a região Seridó, autores como Lamartine (1965) descrevem essas casas de

modo geral como sendo confortáveis e apontam para algumas das características marcantes

dessas casas:

Assentada no alto – para melhor aproveitar a frescura dos ventos e oferecer posição

mais vantajosa quando dos ataques dos cangaceiros – era de construção sóbria,

alpendrada, de duas águas e levantada com madeira, pedra, tijolo e telha da própria

fazenda. Não oferecia beleza artística dos casarões do açúcar, de grades de ferro-

trabalhado e arabescos de argamassa e pedra. Nenhum enfeite transparecia de sua

arquitetura e seu conforto maior parecia residir no frio das lajes do alpendre ou na

carícia da rêde armada no quarto do sótão. (LAMARTINE, 1965, p. 15, 23)

A descrição de Lamartine (1965) chama a atenção para alguns elementos como implantação,

orientação, materiais e sistemas construtivos, que de acordo com a experiência dele eram

determinantes para que essas casas fossem agradáveis a despeito do clima e condições físicas do

contexto onde se inserem.

As habitações rurais das fazendas de criar do Seridó potiguar construídas no século XIX tornam-se

referência pelo seu caráter vernacular, por se tratar de uma produção arquitetônica adaptada às

condicionantes do lugar, nos mais diversos aspectos (econômicos, culturais, construtivos, físicos,

etc.). Tendo em consideração a premissa supracitada, a pesquisa que foi desenvolvida durante o

mestrado acadêmico no Programa de Pós-Graduação em Arquitetura e Urbanismo da Universidade

Federal do Rio Grande do Norte (PPGAU-UFRN), teve como objetivo geral identificar quais as

particularidades das casas de fazenda do Seridó contribuem para a adaptabilidade destas

edificações ao clima semiárido, como ambientes de proteção; e contribuir para ações de valorização

do patrimônio arquitetônico em questão.

Para atingir o objetivo geral foram adotados procedimentos divididos em duas etapas.

Primeiramente uma pesquisa bibliográfica contemplando os inventários existentes (DINIZ, 2008;

FEIJÓ, 2002; IPHAN, 2012), tornando possível a definição da amostra conforme a possibilidade de

acesso ao interior das casas, proximidade a outros exemplares, bom estado de conservação e

preservação. Deste modo, as fazendas selecionadas foram: Pitombeiras, Agenus e Garrotes, no

município de Acari; e no município de Caicó, Palma e Penedo. A segunda etapa consistiu no

levantamento arquitetônico, registro fotográfico, modelagem tridimensional digital (visando a

ampliação da documentação e registro existente); e no monitoramento térmico ao longo de

aproximadamente um dia representativo em cinco casas de fazenda, relacionando o desempenho

térmico das casas com suas características individuais. As variáveis escolhidas para análise do

monitoramento se baseiam no modelo de conforto térmico adaptativo (SPAGNOLO e DE DEAR,

2003 apud NEGREIROS, 2010). As características das casas foram analisadas conforme o

atendimento às estratégias de condicionamento térmico passivo recomendadas pela Norma NBR

15220 (ABNT, 2005), para a zona bioclimática 7, onde se inserem os municípios de Caicó e Acari.

O levantamento dos dados nos inventários e

in loco

mostrou que as casas estudadas apresentam

características peculiares no que diz respeito à flexibilidade e versatilidade, isto é, o programa

dessas casas não é estático, pois os ambientes que em determinado momento têm uma função,

podem rapidamente ser ajustados para atender a novas necessidades. Além disso, os materiais

quase que na totalidade são obtidos na própria região e são utilizados sistemas construtivos de

acordo com a mão-de-obra disponível. A prova do tempo, cerca de dois séculos, confirma a

durabilidade e resistência dessas edificações, que se mantêm firmes e em bom estado de

conservação quando recebem a devida manutenção e permanecem em uso.