Retratos da pandemia: conexões - desconexões & reconexões

34 Marcela Nunes Penna, Vanessa da Silva, Flávia Pereira Galisteo, Michele Scheffel Schneider e Melina Lima de violência doméstica, dados que podem estar muito subestimados pela possibilidade de subnotificação de casos, por motivos de medo do agressor ou vergonha de denunciar, conforme já apontado. Também mostra-se relevante evidenciar a desigualdade racial dentro dos crimes de gênero. De acordo com Cerqueira et al. (2019), a taxa de homicídios de mulheres não negras cresceu 4,5% entre 2007 e 2017, sendo que a taxa de homicídios de mulheres negras cresceu 29,9%. Outro cenário alarmante demonstrado por esta pesquisa é a possibilidade do aumento de cidadãos com armas de fogo dentro de casa, a partir da facilitação da posse de armas, deixando as mulheres em situação de violência ainda mais vulneráveis. Para Hirigoyen (2006), a violência conjugal está diretamente atravessada pelo ciclo da violência, que se desenvolve em três fases e de forma contínua. Aprimeira fase seria a construção de um tensionamento dentro do relacionamento, que ocorre através de humilhações públicas, abusos verbais, atribuição de culpa à mulher por algum fracasso dentro da relação ou situação externa. Ocorre então uma explosão de violência, com um descontrole dos impulsos e possivelmente violência física, também mediadas por armas ou outros instrumentos, em que as promessas realizadas nos momentos agradáveis do casal são esquecidas. Por conseguinte, Hirigoyen (2006) aponta para um momento de lua de mel, com arrependimento do agressor, em que o mesmo demonstra medo de perder a companheira e remorso, com intensos pedidos de perdão e formas de compensar a violência cometida. Dá-se então um recomeço do ciclo, em que Bittar e Kohlsdorf (2013) apontam para uma crescente intensidade e aceleração de sua duração. Bittar e Kohlsdorf (2013) demonstram que para que o ciclo da violência possua essa característica de recorrência, alguns fatores podem ser associados, como inversão de culpa – em que o agressor colocaria a culpa de estar realizando a agressão na própria vítima –, dependência financeira e/ou afetiva, o pensamento crítico de que a mulher não estaria realizando seu papel corretamente, visto que, pela perspectiva social, a mulher seria responsabilizada pelo bom andamento da relação conjugal e a vida familiar. Além do estigma social que a mulher carrega por uma disfunção no relacionamento conjugal ou familiar, a violência física ou psicológica pode acarretar em sequelas psicológicas mais graves do que os próprios efeitos físicos, já que o ocorrido destrói a autoestima da mulher, expondo-a a um risco elevado

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