Saúde e cuidado no serviço escola: adolescência presente!
76 Uma clínica grupal com adolescentes em padecimento Como terapeutas, após o encontro, em supervisão, fomos pensan- do e analisando as formas de atuação e gestos no setting terapêutico, seus corpos no chão, próximos uns dos outros, seus movimentos de atualização de um passado em falas e movimentos regressivos; ensaiaram habitar um certo campo de criação, como diria Deleuze como um campo de poiésis, de criação de si e do outro. Nós também sentíamos e vivíamos um momento de grupo único. Aquele espaço-tempo parece ter proporcionado a elas, naquele momento, uma experiência intensiva, de poder transbordar, pois ali tinha um contorno, uma segurança, se colocando um espaço potencial, que per- mitia falar de outro jeito, como nunca foi falado, até mesmo brincar, talvez, como nunca foi brincado. (WINNICOTT, 1975). Considerando que o olhar materno é importante na constituição psíquica e que estas adolescentes podem ter sido privadas disto na infân- cia, entendemos que na adolescência existe a oportunidade desta reedição, quando o adolescente revive a problemática edípica e tem a chance de res- significar as experiências infantis. (CASTRO; STÜRMER, 2009). Apesar de entendermos que os adolescentes já não procuram exclusivamente no olhar materno, mas sim no social delineamentos para seus sentimentos e reconfiguração de seus modelos de representação, consideramos que as prováveis falhas no cuidado de algumas das meninas do grupo, apontam para ainda haver nelas uma certa expectativa ou necessidade de conquis- tar estes olhares parentais. (WINNICOTT, 2005). A falha básica ocorre quando durante as fases iniciais do desenvolvimento, houve um trauma, uma marca importante que fixou o sujeito nesta etapa da relação objetal e que mais tarde, nas outras relações da vida, recorre à ela, regredindo. (BALINT, 1993). A partir das entrevistas e das narrativas das meninas sobre seus pais e seus cotidianos domésticos, percebíamos que para estes pais conseguirem olhar para suas filhas, era muito difícil, eles não têm diálogo, pouco brin- caram juntos, não entendem por que suas filhas estão sofrendo ou falam em morrer. Não entendem do que sofrem. Parece não ter afinal, “cons- truído espaço nestas famílias para estes adolescentes e suas conflitivas, não sendo dado escuta aos filhos e nem tampouco validados seus sentimentos. O investimento libidinal do começo da vida é fator primordial para cons- tituição do Eu, sendo necessário que o sujeito seja desejado e este desejo tenha como função, também para os cuidadores ser afetado, pois para que o sujeito se sinta desejado é importante perceber que afeta o Outro. Para essas adolescentes, percebe-se que faltou embalo, olhar e presença. Segundo Wanderley (1977 apud MENDONÇA, 2017) uma presença que cria corpo: o corpo da palavra, o corpo do desejo, o corpo do sujeito.
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