Grupalidade em um serviço escola: multiplicidades de um fazer cotidiano
Alexandre de Oliveira Henz, Sidnei José Casetto e Angela Aparecida Capozzolo 89 questões relativas aos modos contemporâneos de atuação dos profis- sionais no campo da saúde, fortemente permeados pelo saber e dis- curso da biomedicina, e também pelo que temos denominado de clíni- ca comum. (CAPOZZOLO; CASETTO; HENZ, 2013), procurando localizá-las em seus lastros históricos e políticos. Tal discussão tem sido colocada pela experiência da formação interprofissional no campus da Baixada Santista da Universidade Federal de São Paulo. A clínica moderna e o discurso médico A medicina moderna começa a se desenhar na passagem do sé- culo XVIII para o século XIX com uma mutação do saber médico, que se relaciona não apenas a uma reorganização dos conhecimentos da área, mas à possibilidade de reorganização do discurso sobre a doença. Para Foucault (1998), a invenção da clínica moderna ocorreu a partir da ruptura conceitual promovida pela anátomo-clínica, que modificou o olhar sobre o patológico e implicou no desaparecimento da chamada medicina das espécies – voltada para o estudo das doenças entendidas como realidades em si mesmas – em favor de uma clínica que colocava em seu centro o pathos individual. A nova estrutura da clínica moderna substitui a pergunta “o que é que você tem?” que iniciava o diálogo entre o médico e o pacien- te, por “onde lhe dói?”. No início do século XIX, pela primeira vez na história da clínica ocidental, é o doente, e não a doença, que ocupa o foco central. Tal doente corresponde a um homem objetivado, um homem-corpo, homem sede de doenças. A medicina moderna localiza e produz no corpo o lugar da doença. A crescente capacidade desta clínica para recuperar e man- ter o funcionamento do corpo, independentemente de as causas do adoecimento estarem relacionada às condições de vida ou de trabalho (SCHRAIBER, 1992, 1993; CAMARGO, 2003), amplia, gradativamen- te, o poder da medicina para definir normas de saúde para a popu- lação. A medicina vai adquirindo uma função disciplinar como parte integrante do poder do Estado, quer pelo mascaramento dos conflitos sociais pela sua redução a problemas médicos, quer pela normalização dos corpos por práticas sanitárias (FOUCAULT, 2001). Esta medicina dos indivíduos é também uma medicina da po- pulação: [...] a medicina moderna é uma medicina social que tem por background uma certa tecnologia do corpo social; a medicina
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