Um jeito de ser e viver no kilombo de Mãe Preta
75 UM JEITO DE SER E VIVER NO KILOMBO DE MÃE PRETA Na Morada da Paz, cujo nome já carrega o sentido de ‘casa’, espaço protagonizado por mulheres negras, ocorre de maneira diferente. Podería- mos justificar essa diferença devido ao contexto histórico, onde o segrega- cionismo racial opera de diferentes modos nos Estados Unidos e no Brasil, onde a ‘miscigenação’, ferramenta do poder que camufla desigualdades, seria a resposta para o fato da Morada da Paz ser um espaço de cura e cuidado não restrita à comunidade negra. Acredito ser mais interessante se compreendermos a cura e o cuidado a partir dos termos da comunidade, em que a dimensão ecológica da espiritualidade ocupa papel central. Figura 19: Caminho iluminado. Acervo Folayan. Quando uma mulher negra, estudante universitária, que frequentou a Morada da Paz durante um tempo questionou Ys. sobre a existência de brancos na comunidade, ela a respondeu: “ nós não sabemos quem real- mente foi o feitor! ”. A existência de cada sujeito é compreendida para além dos invólucros identitários, pois adotam uma concepção reencarnacio- nista, entendendo que após a morte pode-se voltar a viver neste mesmo mundo através de novas identidades. O mesmo é dito para as diferenças de identidade de gênero, e as Yas frisam constantemente que desejam que mais homens participem da comunidade. Afinal, o que está em jogo, sobre- tudo, é um projeto espiritual 15 e uma guerra cósmica . 15 Quando conversava sobre o porquê de buscarem o reconhecimento do território como território kilombola, Ik. disse-me que isso veio a partir da orientação de uma entidade,
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