Um jeito de ser e viver no kilombo de Mãe Preta
55 UM JEITO DE SER E VIVER NO KILOMBO DE MÃE PRETA diálogo que as Yás e o Babá mantém com a universidade e o conhecimento formal e as orientações de Mãe Preta, Seu Sete e os Orixás que frequentam o território e os educam para reafirmar seu modo de ser e viver kilombola, ancorado na espiritualidade onde o passado é honrado e valorizado porque contém e perpetua a experiência social dos mais velhos e dos ancestrais a partir das narrativas e vivências. O conjunto das atividades desenvolvidas pela CoMPaz, aqui rapida- mente descritas, sugere que várias tecnologias e experiências sociais são desenvolvidas dentro da comunidade e suas narrativas são importantes fon- tes de pesquisa. O kilombo, seu terreiro e diferentes territorialidades têm suas regras, uma ética e uma estética: produzem cultura, tem uma ekono- mia que garante sua sustentabilidade e simbologia. Essas práticas, em nossa leitura, indicam um futuro de possibilidades já existentes, “plurais e concretas, simultaneamente utópicas e realistas, concretizadas através das atividades de cuidado” (SANTOS, 2006a ou b?, p. 116). Dialogam com um saber tradicional, matricial, crítico e autocríti- co, contextual que permite gestar projetos produtivos de caráter autossus- tentáveis e emancipatórios que buscam transformar e transcender a realida- de. O Kilombo realiza um trabalho de recuperação da sabedoria ancestral africana e afro-brasileira, que relacionamos com a ideia de Bem Viver que é um “processo proveniente da matriz comunitária de povos que vivem em harmonia com a Natureza” (ACOSTA, 2016, p. 24). Este autor sustenta que os indígenas – e nós acrescentamos os kilombolas e demais povos tra- dicionais – não são pré-modernos nem atrasados. Seus valores, experiências e práticas sintetizam uma civilização viva, que demonstrou capacidade para enfrentar a Modernidade colonial. Com suas propostas, imaginam um futuro distinto que já alimenta os debates globais. O Bem Viver faz um primeiro esforço para compilar os principais conceitos, algumas experiências e, sobretudo, determinadas práticas existentes nos Andes e na Amazônia, assim como em outros lugares do planeta (ACOSTA, 2016, p. 24). Neste artigo apresentamos uma cartografia possível de uma pesquisa ainda em curso, que vem ao encontro da percepção da comunidade, da necessidade de sistematizar toda uma gama de saberes amealhados para qualificar e prosseguir a sua missão de transformação civilizatória. Nesse sentido, entendemos que este estudo se insere no conjunto de uma série de propostas oriundas de diferentes culturas que buscam bem conviver em comunidade e com a natureza, revelando as potencialidades, as contribui- ções, as articulações, as novas configurações, os alcances, os desafios, os
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