Um jeito de ser e viver no kilombo de Mãe Preta

44 SÉRIE SABERES TRADICIONAIS – VOL. 3 COMUNIDADE KILOMBOLA MORADA DA PAZ, TERRITÓRIO DE MÃE PRETA Deus é uma mulher preta E por natureza sei que vou sobreviver Deus é uma mulher preta Benção minha mãe para lutar e escreviver A morte meu país genocida reservou pra mim Porém minha alma não é uma semente daqui É semente da mente de Deus é de lá de onde eu vim Rainhas de ontem e hoje florescem em mim A morte atravessa os sonhos de pretos aqui Encaro e grito pro Estado não saio daqui Minha mãe me abençoe e dê forças pra eu prosseguir Seus olhos d’agua refletem a força que moram em mim Jéssica da Silva Gaspar Carvalho, Turatti e Schmitt (2002) descrevem a definição clássica de quilombo, que vigorou até meados da década de 1970. Em 1740, reportan- do-se ao rei de Portugal, o Conselho Ultramarino descreveu da seguinte forma o quilombo: "toda habitação de negros fugidos, que passem de cin- co, em parte despovoada, ainda que não tenham ranchos levantados e nem se achem pilões neles" (CARVALHO; TURATTI; SCHMITT, 2002, p. 2). Nessa descrição há a presença de cinco elementos: “a fuga, uma quantida- de mínima de fugitivos, isolamento geográfico, em locais de difícil acesso e mais próximos de uma natureza selvagem que da chamada civilização, moradia habitual, referida no termo rancho, autoconsumo e capacidade de reprodução, simbolizados na imagem do pilão de arroz” (CARVALHO; TURATTI; SCHMITT, 2002, p. 2). O Decreto 4887/2003 amplia esse entendimento e reconhece que co- munidades quilombolas são grupos étnico-raciais segundo critérios de “auto atribuição, com trajetória histórica própria, dotados de relações territoriais específicas, com presunção de ancestralidade negra relacionada com a resis- tência à opressão histórica sofrida” (BRASIL, 2003, p. 1). Em 2013, levanta- mento do governo federal indicava cerca de 214 mil famílias e 1,17 milhões de kilombolas em todo Brasil (BRASIL, 2013). Algumas dessas famílias vivem na Comunidade Kilombola Morada da Paz, Território de Mãe Preta. ACoMPaz é uma comunidade kilombola espiritual e ecológica, habi- tada por mulheres e homens negros que migraram da região metropolitana

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