Um jeito de ser e viver no kilombo de Mãe Preta

26 SÉRIE SABERES TRADICIONAIS – VOL. 3 lha juntamente com o exercício da honestidade e da ética sempre foram e são paradigmas para nossas tomadas de decisões. Provavelmente por ser- mos uma comunidade marcantemente feminina, acreditamos nos diálogos produtivos e incentivamos reuniões, mesmo que prolongadas, para que o tempo de gestação e parto da decisão final se processasse. Cada opinião é levada em consideração e observada cuidadosamente às contradições e pontos comuns entre todos e todas, a fim de que cada integrante possa ter o sentimento de pertinência e responsabilidade no resultado final. Muitas ve- zes esse processo nos levava a dificuldades aparentemente intransponíveis. Nesses instantes retomamos sempre a causa inicial, o motivo pelo qual nos reunimos e isso facilita o processo. Outro fator que nos auxilia é a observação atenta das opiniões prove- nientes exclusivamente de conveniências pessoais, pois estas são questio- nadas por todos e todas de forma aberta, na tentativa de uma redefinição de posicionamento daquele e daquela que trouxe a proposta à baila. Exer- citamos práticas que fortalecem nossos mitos e sedimentam nosso patri- mônio imaterial afro-brasileiro, facilitando sobremaneira nossas decisões: o Ipádè (a roda ou círculo), o rezo cantado (oração às Deusas e aos Deuses Mãe-Pai), as meditações, orins e a reverência a Yami, a nossos Òrí ş ás e à Mãe Natureza como uma de nossas Mestras. Foi e é dessa forma que conseguimos sobreviver na localidade de Vendinha, entre as fronteiras dos municípios de Triunfo e Montenegro, no Rio Grande do Sul. Somos uma comunidade que nasce em meio a um contexto de contraditórias profecias em que o mundo de Olódùmarè-Zambi-Maya, em seu transcurso, exige que se abandone a superficialidade e se busque a raiz dos processos. Nós estamos vivendo cada instante focalizando um horizonte: viver como se fôssemos morrer amanhã, deste modo, estaremos, no amanhã, sen- tados e sentadas nos Ipádè (círculos) dos ancestrais. Mas o amanhã ainda não chegou – ele está vindo – então, é nossa a tarefa pedagógica de contar e realizar nossa própria história. PROPÓSITO DA COMPAZ • Recuperar e reverenciar a educação ancestral (afro-brasileira; afrodiaspórica e africana) como continuidade de educação das gerações futuras dos jovens kilombolas. • Servir a humanidade sem interesses pessoais, político-partidários e/ou financeiros. O serviço deve vir orientado por uma condu- ta ética, amorosa e baseada na cooperação, solidariedade, com- preensão e sororidade.

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