Caso do papagaio Verdinho e a transição de paradigma na jurisprudência brasileira 87 não apenas um direito com valores ocidentais modernos, mas valores plurais contidos na sociedade4 . Assim, a “consciência ecológica” e a visão ampla dos direitos humanos tratados na decisão embasam uma leitura de direitos humanos que contemplem os direitos da natureza, a partir de mudança de consciência de visão de mundo, que reconhece a “conexão simbiótica entre os seres humanos e a Natureza e decorre da indissociabilidade entre eles” (MORAES, 2019). Dessa forma, é possível fazer uma leitura ainda mais ampla e instrumental do caso em análise pautada nas suas referências explicitas aos Direitos da Natureza, ao pluralismo jurídico e ao reconhecimento da importância do movimento global neste sentido, sustentando, assim, a transição para o paradigma ecocêntrico. 6.4 REPERCUSSÕES E IMPLICAÇÕES PARA OUTROS CASOS O caso do papagaio Verdinho, Recurso Especial 1.797.175-SP (2018/0031230-00), julgado em 2019 pelo Superior Tribunal de Justiça, é um precedente que tem grande potencial de provocar significativo impacto no direito brasileiro. Com base na argumentação sustentada pela corte de ampliação de direitos fundamentais para além da vida humana e da sua importante referência à doutrina e à legislação e casos de outros países mais receptivos aos direitos da natureza, a decisão tem grande potencial para ir além do caso em tela e ser citada e utilizada na fundamentação de outras ações. Conforme suprarreferido, apesar de não ter caráter de vincular outras ações, o precedente mostra uma abertura do STJ a uma transição paradigmática. Trata-se do segundo tribunal de maior relevância do país, e que faz o controle de legalidade em última instância e, portanto, tem forte poder persuasivo nas cortes inferiores de todo o país. Além disso, embora o caso derive de um vínculo de propriedade ou posse entre a o animal e sua dona, o acórdão supera a demanda estrita e traz, inclusive, uma visão de superação da propriedade e compreensão de uma relaço de reciprocidade. Como exposto, houve no acórdão uma interpretação ampla e alem do pedido, chegando inclusive ao ponto de considerar o papagaio como detentor de direitos e de dignidade. Sendo assim, o caso é divisor de águas e pode subsidiar futuras ações e comunidades em suas lutas pelo Direito da Natureza no Brasil. O reconhecimento de direitos, inclusive de criação de tese de “dimensão ecológica da dignidade”, traz consigo uma superação do paradigma antropocêntrico e pode ser instrumental não apenas em relação a direitos de animais, como também da fauna, da flora e do ecossistema de maneira ampla. Na medida em que forem ajuizadas novas ações, 4 A construção deste novo constitucionalismo se alinha ao que Boaventura de Sousa Santos se refere como “sociologia das ausências e das emergências”, que trariam a superação de dualidades e romperiam com a hierarquia do direito e de todo o conhecimento ocidental com o tradicional estabelecida desde o colonialismo (SANTOS, 2002).
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