Chantelle da Silva Teixeira 58 data de emissão da sentença pela Corte, ainda havia 45 não indígenas ex-ocupantes do território esperando receber indenização do Estado em virtude das benfeitorias de boa-fé, além de seis ocupantes não indígenas permanecem dentro do território indígena Xukuru. Em paralelo ao procedimento fundiário que se arrastava injustificadamente, como forma de pressionar o órgão indigenista responsável pelo processo, bem como forçar o próprio governo a liberar recursos para indenização e desintrusão dos não indígenas da Terra Indígena, os Xukuru realizaram “retomadas” das áreas consideradas prioritárias. Nesse contexto, foram retomados locais sagrados como a aldeia Pedra D’água, por exemplo, onde se localiza o terreiro de Toré da Pedra D’Água, espaço sagrado, onde rituais de pajelança e festas tradicionais são realizados pelos Xukuru. As retomadas foram fundamentais no processo de recuperação do território Xukuru, contudo desencadearam ações de criminalização, perseguição e atentados que culminaram no assassinato de importantes lideranças. O processo de demarcação do território Xukuru foi tumultuado e marcado pela omissão estatal nas medidas de retirada dos terceiros ocupantes do território, muitos recursos administrativos e ações judiciais foram interpostos, questionando aspectos formais e materiais do procedimento, na busca de anulá-lo totalmente ou em partes com o reconhecimento de propriedades rurais incrustadas no seu interior. Isso se somou ao processo de perseguição, ameaças e assassinatos. 4.3 SENTENÇA EMBLEMÁTICA: BRASIL É CONDENADO PELO SISTEMA INTERAMERICANO DE DIREITOS HUMANOS Em 16 de outubro de 2002, organizações da sociedade civil que atuam para a proteção de direitos – o Movimento Nacional de Direitos Humanos/Regional Nordeste, o Gabinete de Assessoria Jurídica às Organizações Populares (GAJOP) e o Conselho Indigenista Missionário (CIMI) – apresentaram uma denúncia ante a Comissão Interamericana de Direitos Humanos4 em virtude da violação do direito à propriedade coletiva e das garantias de proteção judicial, consagrados na Convenção Americana de Direitos Humanos, em prejuízo do povo indígena Xukuru e seus membros. Após mais de 15 anos de tramitação no sistema interamericano de direitos humanos, em 28 de fevereiro de 2018, a Corte Interamericana de Direitos Humanos proferiu a decisão do caso. A seguir destacamos os dispositivos que consideramos mais importantes para o estudo, referentes ao direito à propriedade coletiva dos povos indígenas e seus reflexos. Assim, a Corte declara por unanimidade: 4 A CIDH é um órgão principal e autônomo da Organização dos Estados Americanos (OEA) encarregado da promoção e proteção dos direitos humanos no continente americano. É integrada por sete membros independentes que atuam de forma pessoal e tem sua sede em Washington, D.C. Foi criada pela OEA em 1959 e, juntamente com a Corte Interamericana de Direitos Humanos (CorteIDH), instalada em 1979, é uma instituição do Sistema Interamericano de proteção dos direitos humanos (SIDH).
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