A capoeira joga com a dureza da vida

97 A CAPOEIRA JOGA COM A DUREZA DA VIDA Ele encontrou em Caçapava do Sul uma madeira muito boa para fazer berimbau, o “Catiguá”. Contou que descobriu a madeira na “boca do mato” onde ficava durante horas do seu dia. Que passou muitas vezes pelo Catiguá, que se criou junto ao Catiguá. Conta que certa vez foi ao mato à procura de uma verga boa para fazer um gunga. Conta que já havia passado pelo Catiguá, mas não havia dado a devida atenção. Então foi na ladeira da mata onde corre o rio que ele encontrou o Catiguá. Por ter se criado no mato, ele conta que domina a caça, sabe caçar tatu e outros bichos. E então, saindo em busca do Catiguá, ao adentrar o mato para fazer a coleta de verga para berimbau, enxergou um Catiguá e, ao mesmo tempo, apareceu uma ave Jacu. O Jacu comia o fruto do Catiguá (fruta que arrebenta), relatou o professor Caçapa. Ao enxergar o Jacu, resolveu caçar o Jacu e, após isso, o Catiguá sumiu da sua frente. Ele afirma que houve uma interrupção da energia da caça sobre a energia da coleta de madeira. As energias da mata são diferenciadas, afirma ele. Enfim, me revelou que ao caçar o Jacu estaria abrindo mão da coleta de Catiguá. O relato de Caçapa me levou ao encontro do trabalho de Ramos (2015), em: “[...] as formas territorializantes que comunidades quilombolas e coletivos afrorreligiosos operam a partir de relações intensivas com a natureza e seus diversos entes (plantas, animais, pedras, águas, entidades, deuses/as, espíritos)” (RAMOS, 2015, p. 43). Caçapa conta que, após alguns minutos refletindo sobre isso e ao conectar-se com as forças da natureza, o Catiguá apareceu novamente à sua frente. Ele relatou uma conexão com o espírito do Catiguá e os espíritos da mata que o levaram a refletir. Durante essa conversa com Caçapa, passava por ali uma mulher de aproximadamente 35 anos, e Caçapa falou: Olha só, chega aí. Precisamos te ouvir porque meu amigo está fazendo uma pesquisa importante para a nossa comunidade. Desse modo, Caçapa convenceu Greiciane, mãe de A., 10 anos. Ela disse que não queria gravar, ao falar-lhe sobre a pesquisa ela se mostrava nervosa e com a voz trêmula, mas afirmou que a capoeira modificou e melhorou muito a vida de seu filho, pois se trata de um menino que não seguia algumas regras, que não frequentava a escola, e a capoeira fez com que ele levasse mais a sério a escola, pois o ato de treinar capoeira só seria

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