51 A CAPOEIRA JOGA COM A DUREZA DA VIDA No cotidiano brasileiro é ilustrado um descompasso provocado pelo distanciamento entre origens culturais e fomentado pela hierarquização e supremacia condicionada pela visão de mundo eurocentrada. Esses valores, sendo massivamente incorporados pelos indivíduos de uma sociedade multirracial, desestabilizam e inviabilizam a solidariedade. O que ocorre na prática é que a fundamental união entre os atores sociais para alcançarem respectivamente seus objetivos, muitas vezes, se desfaz quando se depara com a fronteira demarcada pelo ideal racista. Conforme, a meu ver, Frantz Fanon relata precisamente: Queria simplesmente ser um homem entre outros homens. Gostaria de ter chegado puro e jovem em um mundo nosso, ajudando a edificá- lo conjuntamente (FANON, 1983, p. 106). Essas relações “voluntariamente” excludentes me trouxeram à memória um artigo intitulado Racismo: um mal-estar psíquico (2012), escrito por psicólogos que prestavam atendimento a pessoas vítimas de racismo. O artigo em que Marco Antônio Chagas Guimarães relata o depoimento de um casal de pessoas negras que se sentiram discriminadas ao serem recebidas por corretores de imóveis em hora e local agendado por telefone. O casal percebeu que a reação das duas corretoras brancas foi uma expressão de espanto e estranheza ao visualizarem os “clientes negros”. Nesse artigo, o sentimento de incômodo vivido pelo cidadão negro se torna explícito quando é relatado o surgimento de uma terceira pessoa a manifestar um olhar preconceituoso que revelava dúvida acerca de seu caráter, o gerente da imobiliária. O casal presenciou o descrédito por parte dos corretores a respeito do seu entendimento sobre assuntos básicos que estavam em jogo para a realização do financiamento. A situação gerou um desconforto desnecessário, pois o casal interessado pesquisara acerca de informações básicas envolvendo direitos de legislação trabalhista por tempo de serviço e garantias pela Caixa Econômica Federal. Em suma, se caracterizava através da reação dos atores sociais brancos uma infantilização dos atores sociais negros que simplesmente buscavam atendimento para adquirir sua casa própria. Sobre o ocorrido, Guimarães (2012) relata que o seu paciente estava há aproximadamente três anos realizando tratamento direta-
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