20 SÉRIE SABERES TRADICIONAIS – VOL. 4 fico perante a disseminação do pensamento europeu. O colonialismo ocidental, ao entrar em contato com diferentes culturas invadindo seus territórios, subjugava-as enquanto “primitivas”, colocando-as à própria margem, induzindo o princípio de que era como fazer uma viagem ao passado, ao primitivismo, ao distante. Ainda hoje, na antropologia, o tempo é um artifício fundamental para o trabalho, de onde se afasta de análises processuais e ao mesmo tempo em que dele faz uso para estabelecer distanciamentos e exoticidade do que foi vivido, ou do que foi testemunhado, todavia não deveria ser base científica para as violentas explorações coloniais em nome de uma progressiva inquisição das almas, baseada na exploração cultural, territorial e escravização dos corpos. Como propõe Sodré (2017), Mas essa ideia de ‘humanidade’ – fachada ideológica para a legitimação da pilhagem dos mercados do Sudoeste Asiático, dos metais preciosos nas Américas, e da mão de obra na África – consolida-se conceitualmente, na medida em que contribui para sustentar o modo como os europeus conhecem a si mesmos: ‘homens plenamente humanos’ e aos outros como ‘anthrops’, não tão plenos. O humano define-se, assim, de dentro para fora, renegando a alteridade a partir de padrões hierárquicos estabelecidos pela cosmologia cristã e implicitamente referendados pela filosofia secular. Desta provém o juízo epistêmico de que o outro (anthrops) não tem plenitude racional, logo, seria ontologicamente inferior ao humano ocidental. É um juízo que, na prática, abre caminho para a justificação das mais inomináveis violências (SODRÉ, 2017, p. 14). A inserção do antropólogo ao contato com os nativos, entretanto, criou em alguns aspectos uma relação de afinidade e exigências de respeito mútuo, o que caracterizou um papel importante para a observação participante e o método comparativo entre essas culturas pesquisadas pela dita cultura civilizada. Enfim, o trabalho antropológico atual deveria estar pautado em reconhecer as tensões e limites acerca da ideia de que conhecimento é poder. Haja vista que essa experiência me conduz a interessantes registros e ao encontro com espaços alternativos de fomento à pesquisa e à emancipação e decolonialidade do poder enquanto potentes referenciais epistêmicos.
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