272 A Segunda Escravidão e o Império do Brasil em Perspectiva Histórica tão importante quanto a real lucratividade produzida pela economia da plantation escravista, diante dos fluxos do café no quadro da economia- -mundo ocidental. Salvo exceções, até o final da década de 1870, a elevação do preço do café e a expansão da malha ferroviária potencializavam os ganhos dos fazendeiros do Vale. Por sua vez, esses elementos impulsionavam a compra de mais escravos, em um contexto favorável aos grandes fazendeiros do Sudeste cafeeiro. Como resultado, do pós-1850 até o início da década da Abolição, as informações censitárias e os índices do fluxo de escravos apontam para o crescimento econômico da grande lavoura escravista. Os dados do mercado de escravos não deixam dúvidas: a demanda de cativos seguia aquecida para os municípios do Vale a um ritmo de 1,6% ao ano, o que representava um pouco mais da metade da média de crescimento para as décadas de 1840-50, que girava em torno de 2,9% ao ano (Slenes, 1986, p. 111). O aquecimento da demanda e a elevação dos preços dos cativos, até o final da década de 1870, são indicativos de que aquele investimento estava antes orientado para o lucro, do que essencialmente atrelado a estratégias de “prestígio”. 11 Na maioria das áreas cafeeiras, somente no correr da década de 1880, a “pressão abolicionista” inviabilizaria gradativamente o investimento em cativos, tornando-o, definitivamente, uma instituição economicamente moribunda (Mello, 1978, p. 45-49). Assim, o abandono da escravidão como investimento econômico era antes resultado dos embates sociais, políticos e morais, do que fruto da incompatibilidade ontológica entre seu desenvolvimento e a economia liberal. Essas questões, bastante caras à geração emergente na década de 1970, foram totalmente desconsideradas nos debates historiográficos das décadas seguintes no Brasil. A crítica ao marxismo estruturalista e aos paradigmas construídos em torno do “modo de produção escravista 11 Segundo Mello, “- se existiam alguns fazendeiros demandando escravos por motivos de prestígio ou ostentação, a demanda agregada desta categoria de donos de escravos era muito limitada e incapaz de elevar o preço de mercado de escravos acima do nível ditado por motivos normais de rentabilidade. - Se para a maioria dos fazendeiros de café o prestígio social fosse parte significativa da sua demanda de escravos, o preço destes estaria acima do nível que existiria, caso considerações econômicas apenas estivessem presentes, e a taxa de retorno seria mais baixa do que a de ativos com risco equivalente, a diferença entre as duas sendo o prêmio pago pelo consumo conspícuo. - Se os fazendeiros de café tinham uma mentalidade pré-capitalista e estavam limitados por atitudes tradicionais e um comportamento paternalista, isso não os impedia de responder aos incentivos de ordem econômica e de alocarem seus recursos como faria qualquer outro grupo orientado para o lucro e possuindo uma mentalidade capitalista” (Mello, 1978, p. 37-38).
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