A Segunda Escravidão e o Império do Brasil em perspectiva histórica

255 Segunda escravidão e Micro-História: um diálogo possível midt-Nowara partiu de um indivíduo, George Danson Flinter, um emigrado irlandês naturalizado espanhol, que escreveu em defesa da escravidão no Caribe Espanhol entre 1820/30, para analisar o pensamento pró-escravista no mundo atlântico durante a segunda escravidão. 14 Contudo, apesar da qualidade dos estudos mencionados, meu questionamento se dirige ao objetivo final da proposta em tela: a elaboração de uma história mundial da perspectiva do indivíduo . Primeiro, a Micro-História não é uma história biográfica, um estudo de caso, ou somente uma história na perspectiva do indivíduo. Estamos diante de uma metodologia que se construiu a partir de múltiplas prerrogativas, como já foi explicitado. Investigar o pensamento de um indivíduo ou o funcionamento diferenciado de uma região escravista em relação a outra traz um olhar mais singular ao objeto, mas não caracteriza Micro-História. Segundo, tenho dúvidas de que o resultado final deva ser necessariamente a construção de uma História Mundial ou Global. Afinal, como equilibrar estrutura e experiência nessa perspectiva que, no limite, foge de um ponto fundamental da microanálise que é a estrutura (construção ou reconstrução) como resultado da pesquisa histórica e do jogo de escalas e não como seu ponto de partida? 15 Neste sentido, penso que outras experiências ainda estão por vir com o propósito de estabelecer pontes consistentes entre macro e microestrutura para os estudos da segunda escravidão. Acredito ser possível um profícuo diálogo entre a segunda escravidão e a Micro-História, mas não necessariamente com a finalidade de construir uma história mundial ou global. Isso poderia ocorrer, ou não, de acordo com a questão e o objeto de pesquisa propostos. A Micro-História certamente pode contribuir para o estudo de totalidades e estruturas, fundadas localmente, comunitariamente, nacionalmente, ou mesmo em outros recortes mais amplos de espaço e tempo. Tais camadas podem ser tra14 Para o historiador, a experiência deGeorge Danson Flinter como emigrado na Venezuela, durante a Independência, e seus processos de revolução e contrarrevolução, o tornaram um defensor da escravidão. Para ele, a escravidão era a melhor forma de trabalho, não somente em Porto Rico e Cuba, mas para todas as colônias espanholas. Seus escritos, publicados em espanhol e inglês, afirmavam que a escravidão espanhola era mais humana e benevolente, em termos legais, do que as experiências inglesa e francesa, e, por isso, as revoltas eram bem menos frequentes. A análise de Nowara demonstra como Flinter se tornou um autor do pró-escravismo na fase pós-Revolução Francesa, pautando discussões com os abolicionistas ingleses e influenciando escravagistas do Brasil, Estados Unidos e Império Espanhol (Schimidt-Nowara, 2014) . 15 Em resposta à perspectiva da História Global, mas não necessariamente à segunda escravidão como conceito, Giovani Levi comenta em entrevista que a História Global não é uma nova metodologia, mas um alerta à falta de consciência do eurocentrismo por parte dos historiadores. Portanto, trata-se da defesa da totalidade policêntrica, sem necessariamente uma proposição metodológica nova. (Oliveira, 2017).

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