A Segunda Escravidão e o Império do Brasil em perspectiva histórica

253 Segunda escravidão e Micro-História: um diálogo possível A ênfase de Tomich é a macroestrutura, a História Global e comparativa, descritas como capazes de construir uma história unificada da escravidão atlântica, ao invés de diferentes histórias sobre a escravidão no Atlântico. Desse modo, seria possível pensá-la como parte integrante do capitalismo em curso. As especificidades e particularidades locais não são negadas. Todavia, estão circunscritas aos processos econômicos mundiais de longa duração. Os atores sociais - senhores, escravos, libertos, homens livres e pobres e outros agentes sociais - não são negligenciados, mas suas vontades, lutas, conflitos e decisões são percebidos dentro do horizonte de possibilidades orientado essencialmente pelas grandes transformações econômicas. 11 EmPelo prisma da escravidão (Tomich, 2004), a prerrogativa global é parte integrante da própria noção de segunda escravidão como instrumental teórico-metodológico essencial para a construção da mirada histórica relacional desejada: uma história da escravidão e do capitalismo na perspectiva atlântica. Também se configura como uma resposta aos efeitos da “virada cultural” na historiografia americana da escravidão e a crença de que a dimensão cultural, compreendida como locus da criação autônoma dos indivíduos, seria um fator explicativo mais importante do que a economia. 12 Desde a publicação do livro, em 2004, Dale Tomich escreveu dois textos, advogando um maior contato entre a Micro-História e a segunda escravidão: Introduction, the second slavery: mass slavery, world-economy, and comparative microhistories (2008), em coautoria com o’ historiador Michael Zeuske, eThe order of historical time: longue durée and Micro-History (2011). Em ambos, no primeiro de forma mais crítica e no segundo mais conciliadora, afirmou que a Micro-História teria o potencial de revelar, através do estudo do tempo curto, as descontinuidades e a heterogeneidades dos lugares, grupos, indivíduos e instâncias estudadas. Desta forma, o tempo curto também poderia ser entendido como uma confluência de tempos múltiplos, constituintes de um tempo plural. Para Tomich, essa reordenação do tempo histórico que a metodologia microanalítica potencializa se 11 “Uma explicação completa da história da destruição da escravidão durante o século XIX teria de levar em conta a diversidade dos fatores políticos, sociais, ideológicos, dos quais as ações dos escravizados não foram menos importantes. Não obstante, a transformação da economia mundial tornou as condições da existência do trabalho mais vulneráveis e voláteis do que antes”. (Tomich, 2011, p. 96). 12 Segundo Baptist, a própria “virada cultural”, como se desenhou, foi uma reação à interpretação de que as pessoas escravizadas eram passivas e se comportavam como o tropo sub-humano dos racistas e paternalistas que defendiam a escravidão. Eram chamadas de “sambos”, ou submissos , que renunciavam a seus interesses em prol de seus senhores, conforme encontrado em David Elkins. (2016, p. 280-181).

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