A Segunda Escravidão e o Império do Brasil em perspectiva histórica

244 A Segunda Escravidão e o Império do Brasil em Perspectiva Histórica portá-las, organizá-las e explorá-las nas cidades eplantationsdas Américas. Para tanto, foi montado um complexo e moderno sistema de tráfico que envolveu diversos agentes sociais na África, na Europa e no Novo Mundo (Blackburn, 2016). Como demonstra Seymour Drescher, o tráfico atlântico conectava fronteiras distantes. Entre meados do século XV e fins do século XVIII, a instituição da escravidão já havia se expandido por todas as costas atlânticas, fazendo com que governantes e negociantes de cada centro comercial europeu e africano procurassem, de alguma forma, participar desse sistema bastante lucrativo (Drescher, 2010). Enquanto a primeira escravidão se apoiava em uma política de concessão de monopólio, a segunda escravidão representaria um sistema escravista mais maduro, autônomo, duradouro, produtivo e veiculado ao mundo capitalista em ascensão. Foi, em grande parte, pós-colonial, industrial, incentivadora de novas tecnologias (tais como ferrovias, transporte a vapor e modernas máquinas agrícolas), e apoiada pelos estados independentes e suas classes dominantes, que passaram a ter uma ligação direta com os poderes regionais e nacionais (Baptist, 2014). Seus plantadores locais integraram o maquinário industrial à utilização da mão de obra escrava para a produção em larga escala. Dessa forma, a segunda escravidão esteve intrinsicamente ligada à aceleração do capitalismo industrial em perspectiva global e ao tráfico maciço de escravos, interno e externo, legal e ilegal, dependendo do espaço e tempo em foco (Blackburn, 2016). A expansão da segunda escravidão no mundo foi impulsionada por diversos eventos e tendências históricas. De um lado, o aumento populacional europeu e o advento da Revolução Industrial, responsáveis pelo incentivo ao consumo de commodities por trabalhadores assalariados e pelas classes médias urbanas das cidades da Europa, Inglaterra e Norte dos Estados Unidos. De outro, as guerras de independência nas Américas, com a formação de elites nacionais locais, e a Revolução Haitiana, que abriria um gap produtivo catalizador de uma nova dinâmica para a economia atlântica. Até a independência do Haiti, proclamada em 1791, a Ilha de Saint Domingue era a principal colônia francesa produtora de açúcar e café, matérias-primas bastante valorizadas no comércio internacional. Contudo, devido aos graves conflitos políticos ocorridos em solo haitiano após a emancipação, houve uma drástica desorganização das principais áreas produtivas. Em pouco tempo, o mercado mundial desse gênero passou por uma forte reconfiguração. As antigas commodities sofreram um barateamento e integraram a dieta do trabalhador, passando rapidamente de artigos de luxo a produtos de massa. As regiões

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