A Segunda Escravidão e o Império do Brasil em perspectiva histórica

243 Segunda escravidão e Micro-História: um diálogo possível fluminense, no Rio Grande do Sul e no Sertão da Bahia ou no Maranhão, ela se estabeleceu da mesma forma? De que maneira as áreas economicamente periféricas foram afetadas pela segunda escravidão? Como ela se configurou nessas regiões e que mudanças acarretou para os agentes sociais envolvidos? O diálogo com a Micro-História e o jogo de escalas por ela proposto podem ser um bom caminho metodológico para responder a essas e outras provocações que certamente estão por vir. Sobre o conceito de segunda escravidão O conceito de segunda escravidão, desenvolvido pelo historiador norte-americano Dale Tomich, se baseia na percepção das diferenças e especificidades existentes entre a escravidão moderna, preponderante entre os séculos XVI e XVII, e aquela levada a cabo entre 1790 e 1888 (Tomich, 2011). 3 Dessa forma, a primeira escravidão se configuraria pelos monopólios mercantis, os impérios marítimos do mundo pré-moderno (Portugal, Espanha, Países Baixos, Inglaterra e França), quando o capitalismo estava em sua fase de acumulação primitiva de capital. Neste contexto, a partir da expansão marítima e da descoberta das Américas, a escravidão assumiu um caráter colonial, foi regida por fundamentos legais provenientes dos estados europeus e envolveu, sob nova dinâmica, duas instituições tipicamente coloniais: a plantation escravista e o tráfico transatlântico de escravos (Blackburn, 2011; Tomich, 2011b). Cada vez mais, passou-se a escravizar pessoas em escala crescente no continente africano para trans3 O livro saiu em inglês em 2004 e, em português, em 2011, reunindo artigos do autor, escritos entre 1987 e 1997. Sua organização é feita em três partes. Na primeira, A escravidão na economia mundial , apresenta o conceito de segunda escravidão e discute seu ponto de vista teórico contrário a três grandes interpretações da escravidão moderna: a Nova História Econômica (de autores como Robert Fogel e S. Engerman), a marxista, de Eugene Genovese, e a do moderno sistema-mundo, de Immanuel Wallerstein. “Resumida e esquematicamente, a Nova História Econômica presumia a validade universal das categorias econômicas, aplicáveis tanto à economia capitalista quanto à economia escravista, deixando sem resposta as questões pertinentes à interpretação histórica e à formação das relações sociais. Já Genovese veria escravidão e capitalismo como sistemas incompatíveis, este mais moderno e aquele mais atrasado, envolvendo momentos difíceis do processo evolutivo histórico. Finalmente, para Wallerstein, o moderno sistema-mundo, compreendendo relações de trabalho tanto assalariadas quanto coercivas – dentre elas, a escravidão -, se constituiria em uma estrutura histórica empírica, com múltiplas formas de trabalho, entretanto perdendo de vista as diferenças fundamentais entre as distintas relações sociais de produção.” Salles (2013, p. 251-252). Nas partes seguintes, O global no local e Trabalho, tempo e resistência: mudando os termos da comparação , apresenta uma análise comparativa do Caribe Inglês, Francês e Espanhol, entre o final do XVIII e a primeira metade do XIX, a partir do conceito exposto. Para uma resenha do livro aqui citado, ver Salles (2013, p. 249-254).

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