A Segunda Escravidão e o Império do Brasil em perspectiva histórica

213 O anacronismo de um atavismo? A propósito da segunda escravidão sob égide mercantilista uma política econômica “europeia” pode facilmente sugerir muito mais uniformidade e “sistema” do que de fato existiu (...) Mas isso não exclui a existência de um “centro” de suposições e princípios que foram adotados pela maioria dos governantes europeus na maior parte do tempo” (Vries, 2015, p. 325, sublinhado do autor). 7 A exata medida da inviabilidade de uniformizar sistema mercantilista , contraditoriamente, parece erigir dado nível de assertividade à existência de tal sistema. Confesso que a argumentação não deixa de apresentar um cariz sofista. Por outro lado, o debate concernente ao tema parece sugerir que quaisquer esforços de circunscrever e de definir mercantilismo são natimortos. No que se refere ao que foi discutido até o momento, trabalho com sistema mercantilista enquanto uma variada sorte de decisões humanas com vistas à busca, manutenção e maximização de poder em todas as esferas da ação social, quer a nível macro, quer a nível micro. Na época mercantilista, a obtenção de mercados se configurou como tarefa árdua e duradoura. Nesse cenário, e entre os países mais poderosos, o mercantilismo, a construção dos estados, a ereção, conservação e mantenimento dos impérios ultramarinos, ou mesmo suas expansões, sempre estiveram interconectados. Em alguns estados, o mercantilismo esteve mais orientado para aquisição de mercados e para aspectos financeiros, produtivos e de desenvolvimento tecnológico. Em outros, serviu à conquista e preservação territoriais. Seja como for, todos estiveram, em diversos níveis, envolvidos com a escravidão africana. E este é precisamente o elo que pretendo estabelecer para acessar a correlação entre mercantilismo e poder. A concordar com Peer Vries, a maior parte dos mercantilistas acreditava haver uma conexão positiva entre poder e fartura, e que, para acessar o poder, não era possível prescindir do exercício bélico. 7 Para o autor, os governos mercantilistas almejavam, acima de tudo, a produção de mercadorias manufaturadas ou serviço com valor agregado. Com o escopo de aferir um excedente exportador, implementaram uma política de substituição de importações. Em síntese, o mercantilismo pode ser resumido como uma série de medidas de promoção do setor manufatureiro. A incessante demanda por geração de riqueza estava a cargo das políticas financeiras e do poder do Estado, cujo fortalecimento cabia, na visão dos mercantilistas, às atividades comerciais. De resto, o sistema mercantilista promoveu a nacionalizaçãodas atividades econômicas internas, dando margem, no todo, de ser interpretado como uma forma de nacionalismo econômico, cujos desdobramentos favoreceram a construção dos impérios modernos, notadamente no caso britânico (Vries, 2015, p. 326-327, p. 409).

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