A Segunda Escravidão e o Império do Brasil em perspectiva histórica

212 A Segunda Escravidão e o Império do Brasil em Perspectiva Histórica mercantilismo como a condição base para a consolidação do sistema econômico mundial no século XVIII. A conclusão que se impõe, e que interessa extrair, é precisamente que devemos compreender as relações sociais de produção escravista à luz da ótica mercantilista que, ao final e ao cabo, favoreceu, no que tange ao século XVIII, a consolidação do processo de instituição do sistema econômico em escala mundial. Pergunto-me, dessa forma, se obviamente seria leviano considerarmos, por exemplo, as relações de compadrio entre senhor e escravo à luz do mercantilismo, enquanto uma específica construção moral da sociedade com vários desdobramentos, a saber: reiteração temporal do sistema escravista, signo do engenho das estratégias dos escravos com vistas a maximizar ganhos, estratégia senhorial de produção ou exemplo de um comportamento condizente com a sociedade católica coeva. De toda sorte, por que não observar o compadrio como fator componente da complexidade política, social, cultural e econômica que instituiu o sistema econômico mundial setecentista? Estreitando o foco para a correlação basilar do texto, as relações sociais de produção escravista podem ser pensadas dentro da perspectiva mercantilista a fim de acessarmos os matizes históricos da formação do sistema econômico mundial, cujos desdobramentos redundaram tanto na Revolução Industrial, como no advento do sistema capitalista. 6 O tema ora discutido não carece de polêmica. E assim o é em razão, dentre outros pontos, da própria discussão conceitual do termo mercantilismo. Há uma passagem nos escritos de Peer Vries que elucida bem o cerne do problema, ao mesmo tempo em que estende ao debate proposto um norte relativamente seguro. Conforme o autor: Se eu fosse obrigado a caracterizar a política econômica dos governos europeus na era moderna com uma palavra, essa palavra seria “mercantilismo”. Mas não sem riscos. Falar em mercantilismo como 6 Faz-se mister observar que não tenho a menor intenção de reduzir as relações sociais escravistas à esfera econômica. O que proponho é pensar a lógica atinente à segunda escravidão dentro da perspectiva mercantilista, tomando-a como expoente de uma moral social. À vista disso, penso sistema econômico mundial na matriz de uma organização política, social e econômica, proveniente da organicidade das relações sociais dos indivíduos. Não comungo com as teorias que defendem centro e periferia, acumulação de capital via transferência de riqueza, capitalismo mercantil ou financeiro etc. Penso, antes, no processo de unificação mundial caudatário do engenho humano, cujas ações são compostas por uma série de valores que somente de forma arbitrária podem ser isolados e reduzidos às esferas do econômico, do político, do social e do cultural.

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