A Segunda Escravidão e o Império do Brasil em perspectiva histórica

206 A Segunda Escravidão e o Império do Brasil em Perspectiva Histórica posta nos encaminha para a concepção das relações sociais de produção e das particularidades históricas de cada região como partes integrantes e unificadas do desenvolvimento capitalista em escala mundial. Mais de perto, tanto os mercados, como a escravidão, adquirem a roupagem de relações historicamente formadas, reforçando a interdependência entre ambas as esferas (Tomich, 2004, p. 3; Tomich, 2016, p. 66). Avançando, o modelo do autor admite produção, distribuição, troca e consumo como um campo unificado de conceitos relacionais e conectados na forma de mercadoria, donde cada um deles é definido a partir da interação mútua. Do posto, temos um complexo orgânico no qual, e a partir do qual, esses campos estão em perene correspondência uns com os outros, sendo a mercadoria o nexo de ligação entre eles. Ou seja, para compreendê-los, não podemos prescindir de compreender a natureza em si das mercadorias produzidas, distribuídas, trocadas e consumidas no sistema então vigente. Interessa-me destacar que, consoante o autor, cada uma dessas instâncias possui características historicamente dadas. Ao abrigo de semelhantes considerações, a escravidão oitocentista não é vista como capitalista por produzir para o nascente mercado capitalista, nem classificada como não capitalista por não ser uma forma de produção assalariada. Em boa verdade, “o trabalho escravo é tratado como parte da organização do trabalho social em uma escala mundial”, sendo tal organização parte constitutiva de “uma forma específica de produção de mercadoria que está relacionada com outras formas através do mercado mundial e da divisão internacional do trabalho”. O mercado mundial e a divisão internacional do trabalho encerram condição para a reprodução das próprias relações escravistas de produção (Tomich, 2004, p. 29-30). Para Tomich, esse modelo viabiliza a reconstrução da divisão internacional do trabalho historicamente dada como uma relação entre processos materiais específicos e formas sociais de trabalho em regiões particulares, integradas pelo mercado mundial e em constante transformação, a partir de uma inter-relação no tempo e no espaço. Em conclusão, “tanto o caráter capitalista da escravidão, como o caráter escravista do capitalismo emergem das relações evoluídas historicamente entre várias formas de produção e de troca dentro dessa totalidade”. As implicações sobre o tema facultam a reconstrução do desenvolvimento histórico da escravidão imanente a cada região como resultante do sistema econômico mundial, assim como oferecem condições de se diferenciar cada uma dessas esferas escravistas face ao lugar que ocupam no todo econômico e político (Tomich, 2004, p. 29-30).

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