Ecologia Integral: abordagens (im)pertinentes - volume 2
A ecologia dos saberes na cidade: justiça cognitiva e práticas de cuidado em liberdade 53 sujeito, mesmo em sofrimento, é produtivo e criativo. E pode, ainda, servir como testemunho da importância de uma política pública como o SUS, defendendo-o dos ataques e tentativas de privatização, ao se enraizar nas comunidades e territórios das cidades. Dessa forma, o exemplo empírico estudado nos revela algo que pode ser vinculado ao paradigma da economia de Francisco e Clara, que tem sido mobilizado no campo da economia solidária atualmente: novas nor- mas para a gestão da nossa casa comum , que tenham por fundamentos a vida e não a acumulação; a dignidade da pessoa humana, o bem comum e a democracia; a cidadania; a prioridade da educação e a saúde como po- lítica econômica e o respeito à Natureza; e também a finalidade social da propriedade (LIMA, 2020). Outros autores do campo da economia solidária estão fazendo essa relação com a chamada Economia de Francisco e Clara (SOUZA, 2020). A economia solidária é erigida com base nos elementos que esse paradigma preconiza; valores como solidariedade, reciprocidade, reprodução ampliada da vida e não do capital (CORAGGIO, 1999) vinculam as pessoas entre si e com a natureza. Acreditamos que “[...] o ser humano não se circunscreve, de modo algum, ao modelo homo economicus , dos economistas liberais neoclás- sicos, o indivíduo que age exclusivamente por interesse e mediante cálculo” (SOUZA, 2020, p. 15). Por fim, destaca-se que a pesquisa que embasa este texto foi um exer- cício de ecologia dos saberes ela mesma; durante o ano em que convivemos semanalmente com os usuários-trabalhadores-artistas trocamos ideias, afe- tos, práticas artesanais e vivências cidadãs. Acreditamos que é nesses termos, através do uso metodologias participativas e horizontais, do pesquisar com e não pesquisar sobre , que colocaremos em prática a lógica da pluriver- sidade, superando o paradigma convencional da universidade (SANTOS; ALMEIDA FILHO, 2008). A proposta de universidade pós-colonial supera a exclusão dos saberes não acadêmicos e não científicos, recuperando o conhecimento dos sujeitos que os detém, produzindo assim justiça cognitiva e social – ambas indisso- ciáveis na lógica do pluriverso dos direitos humanos, das linguagens e práti- cas sociais (SANTOS; SENA MARTINS, 2019). Tal perspectiva é a de um mundo onde caibam muitos mundos, muitas expressões culturais e éticas e, portanto, muitas subjetividades e corpos que as constituem, incluindo as experiências da loucura em liberdade como relevante modo de conhecer o mundo.
Made with FlippingBook
RkJQdWJsaXNoZXIy MjEzNzYz