Ecologia Integral: abordagens (im)pertinentes - volume 2

A ecologia dos saberes na cidade: justiça cognitiva e práticas de cuidado em liberdade 51 Pois a produção associada permite que os “sujeitos da loucura” en- contrem outros cidadãos e cidadãs, em espaços públicos qualificados das cidades. A partir da produção e comercialização de produtos como pintu- ras, serigrafia, velas artesanais, livros de poesia, bolsas e camisetas com artes originais, fotografias emolduradas, espelhos e mesas de mosaicos e outros produtos, os participantes circulam pela cidade – parques, museus, galerias de arte, teatros, etc. Interagem com clientes, fornecedores de matéria-prima, gestores e fre- quentadores dos locais em que têm pontos fixos de comercialização, como Teatro São Pedro, Cinemateca Capitólio, Centro Cultural Vila Flores, Loja Contraponto na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Essas vivências proporcionam contextos de aprendizagem e de ensino. Iden- tifica-se uma troca de saberes que pode ser considerada como um encontro produtor da ecologia dos saberes; ao conversar com os clientes, trocar ideias, explicar sobre os produtos, os sujeitos sentem que seus saberes são reconhe- cidos, os produtos são elogiados; a reciprocidade com os clientes produz a justiça cognitiva, uma vez que resulta em uma relação horizontal. A ecologia dos saberes é também ecologia dos reconhecimentos, para que a diferença não seja identificada com desigualdade e pessoas com diferen- tes posições nas dinâmicas societais possam acessar, produzir e difundir arte e cultura, trocando experiências e promovendo a justiça cognitiva: o que produ- ziram tem valor, tem legitimidade como arte, reveste-se de um sentido social positivo. Isso altera as constelações de poder que os sujeitos da experiência da loucura estabelecem com o seu entorno (AMARANTE, 2009). Para Cunha (2006), a referência ecológica designa processos que in- cluem o contraditório, os opostos, as temporalidades e espacialidades próprias em interação. Comum às ecologias é a ideia de que a realidade não pode ser resumida ao que existe e que igualdade e diferença são princípios articula- dos, indicando que, quando a igualdade massificar, clama-se pela diferença; e, quando a diferença estigmatizar, clama-se pela igualdade (SANTOS, 2006). Isso exige imaginação epistemológica e imaginação democrática. Implica em desconstrução e reconstrução em patamares, lógicas e padrões diferenciados de existência e de formas de relacionamento (VERONESE, 2008). A ecologia dos saberes objetiva a igualdade nas relações entre diferentes saberes; busca visibilizar formas de conhecer subalternizadas, reconhecendo e legitimando a diversidade epistêmica existente no mundo (VALENÇA, 2014). Essa diversidade epistêmica, uma vez reconhecida em igualdade e em diferença, validada e posta em prática, é conceituada como justiça cog-

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