Ecologia Integral: abordagens (im)pertinentes - volume 2
Sinivaldo S. Tavares 24 poderia, a rigor, continuar falando em um mundo à medida do ser huma- no, mas, sim, de um ser humano à medida do mundo. Por isso, chega-se a empregar o termo “tecnosfera” para se referir a uma espécie de ambiência no interior da qual se produzem novas cosmovisões. Supera-se, por exemplo, aquela visão mecanicista e geométrica da física clássica e sua função domes- ticadora. Agora, no regime da tecnociência, memória e inteligência huma- na são externalizadas em aparatos tecnológicos e a natureza decomposta e recriada segundo os moldes da ciência informática e da biologia molecular. Em outras palavras, a tecnologia deixou de ser aquela espécie de escrava que ajudava o ser humano a alcançar seus próprios fins, para se tornar agora produtora de necessidades das quais o ser humano se torna cada vez mais dependente. O mundo tecnológico se torna cada vez mais imprescindível para a sobrevivência do ser humano. Essa relação entre tecnociência e ser humano torna-se ainda mais com- plexa quando considerada sob o ângulo dos recentes processos de hibridi- zação entre ambos. As tecnologias não se contrapõem simplesmente ao ser humano. Em sua autonomia, a tecnologia é capaz de integrar o ser humano em seu aparato técnico. E o que vem a se criar, a partir daí, é um sistema homem-máquina e os comportamentos humanos ficam reduzidos a meras partes de máquinas, e essas, por sua vez, reguladas pela tecnologia. Com razão, escreve R. Marchesini: A tecnologia transforma a epistêmica humana, importa modelos não- -humanos na dimensão, modifica a percepção formativa que o ho- mem tem de si mesmo, facilita os processos de trocas referenciais com o não-humano; enfim conjuga e hibridiza , não separa nem purifica, antropodescentraliza e não reforça o pensamento antropocentrado (MARCHESINI, 2009, p. 155-156). Isso nos faz pensar que, no final das contas, toda tecnologia é de fato uma biotecnologia. A tecnologia se torna, nesse caso, parceira do ser huma- no uma vez que ela modifica não apenas seu perfil, mas também o modifica enquanto entidade biológica. Nesse sentido, a tecnologia abre-nos para o mundo na exata proporção em que ela facilita os processos híbridos entre humanos e não humanos. De fato, a técnica penetra no interior do ser hu- mano a ponto de se tornar, para todos os efeitos, sua carne. E assim nosso corpo se transforma num verdadeiro campo de aplicação das novas tecnolo- gias e essa hibridização tem se dado numa aceleração crescente com profun- das modificações no tocante aos predicados e atributos humanos.
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