Ecologia Integral: abordagens (im)pertinentes - volume 2
Tecnociência e mercado sob o olhar da Ecoteologia 23 Num tal contexto, a técnica foi excogitada pelo sujeito como instru- mento privilegiado para o exercício desse saber como poder. Com razão se dizia que a técnica nada mais era que ciência aplicada. De fato, a técnica se prestava, na condição de instrumento, a esse domínio do sujeito pensante sobre os demais seres considerados meros objetos mensuráveis. Concebida como mero instrumento, a técnica era vista como emanação do sujeito, vale dizer, uma espécie de extensão de seus membros com vistas à potencialização de seu domínio sobre as coisas. Numa palavra, a tecnologia era considerada mero instrumento à disposição do ser humano. Desde algumas décadas, estamos assistindo a uma expansão tamanha das novas tecnologias a ponto de se caracterizar uma autêntica virada epocal. De mero instrumento de dominação à disposição do ser humano, ela teria se constituído em horizonte último no interior do qual se desvelam todos os âmbitos da experiência, chegando a condicionar inclusive a maneira de o próprio ser humano se autoconceber. Afinal, todo controle não encarnaria pretensões de totalidade? A ex- pansão de um controle planetário não seria inerente à essência mesma de toda técnica? As tecnologias contemporâneas não estariam apenas levando às últimas consequências o intento moderno do saber como poder? O avan- ço das tecnologias e sua expansão têm produzido um fenômeno descrito como “deslocamento da subjetividade”. Quem melhor tem caracterizado essa passagem é o filósofo italiano Umberto Galimberti. Escreve ele: A essa altura, o homem não é mais sujeito , mas algo “disposto” no ho- rizonte desvelado pela técnica, que é, pois, o que decide o modo de o homem perceber, sentir, pensar e projetar. [...] A técnica que em sua versão antiga, era o mediador na relação homem-natureza, na sua versão moderna torna-se o horizonte dentro do qual o homem e a natureza são dispostos pelas demandas que as possibilidades técnicas promovem. [...] o homem não é mais capaz de perceber a si mesmo fora do mundo disposto pela técnica. Como seu ambiente , a técnica é aquilo em relação ao qual o homem de hoje chega ao conhecimento de si. [...] Por isso, dizemos que na disposição do mundo , e não na instrumentalidade , deve ser identificada a essência da técnica. E isso significa que a técnica não é mais ciência aplicada , mas horizonte dentro do qual também a ciência pura encontra a condição e a destinação do seu indagar (GALIMBERTI, 2006). A constatação desse processo simultâneo da “emergência da tecnosfe- ra” e do “deslocamento da subjetividade” justificaria por si só a necessidade de uma hermenêutica própria para se compreender a tecnociência. Não se
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