Ecologia Integral: abordagens (im)pertinentes - volume 1
Racismo Ambiental, Ecologia Integral e Casa Comum:... 99 Saindo deste contexto da “casa grande e senzala”, nos deixamos in- terpelar pela provocação da “ casa comum ”, buscando assim, ancorar novas categorias pensando outras possibilidades de projeto para nossa sociedade. Em um seminário interno, em 2008, no Grupo de Cidadania e Cultura Religiosa, com a presença de um grupo de vinte a trinta negras e negros da comunidade local, em atividade de “hermenêutica coletiva” ligado a um projeto de pesquisa, foi feita uma pergunta: “qual é o projeto dos afrodes- cendentes no Brasil?” A pergunta estava na sequência de uma reflexão so- bre “o ser humano como um ser de projeto”, de parte do professor José Ivo Follmann, que estava na coordenação do projeto. O silencio provocado pela pergunta foi grande, até o momento em que uma senhora, com fala firme falou: “o projeto dos negros aqui no Brasil é o projeto dos brancos!” Ou seja, quem faz o projeto é a “casa grande” branca. Projeto não é coisa de “senzala”. A “casa grande” continua dona dos corpos e das mentes dos negros e das negras. É a leitura da realidade brasileira que temos normalizada, espontânea e imediata, espelhando o racismo estrutural que atravessa historicamente toda a nossa sociedade, a partir dos mais de 350 anos de estruturação na “casa grande e senzala”. Trata-se evidentemente de uma leitura rasa, que normal- mente é reproduzida, sem dar conta da história real, dos inúmeros levantes e processos de revolta e buscas de emancipação, em geral abafados e tornados frágeis, insignificantes e invisíveis nas narrativas oficiais. A provocação da “ casa comum ” nos leva a um novo patamar de des- pertamento geral. Entendemos que a Carta Encíclica do papa Francisco (FRANCISCO, 2015) com a pertinente provocação da “ casa comum ” não só chama para o cuidado do meio ambiente, mas chama, sobretudo, para a necessidade de desmontar as estruturas mentais de dominação, exclusão e discriminação em nosso convívio social. A encíclica produzida pelo papa Francisco em 2015 focou um projeto no qual o objetivo deveria ser o cuidado com a casa comum , definindo esta como a “comunidade da vida” do planeta (ALVES, 2015, p. 1316). A carta encíclica é uma carta circular do papa de Igreja Católica dirigida normal- mente às demais lideranças da Igreja, sendo algumas, como é o caso da Lau- dato Si’ (FRANCISCO, 2015) dirigida como convite de reflexão e apelo a toda humanidade, sobre determinado tema comum relevante. Nesse senti- do, a carta evoca a consciência humana para o despertar de um olhar crítico e ao mesmo tempo complacente sobre o planeta e toda a vida que o habita.
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