Ecologia Integral: abordagens (im)pertinentes - volume 1
Adevanir Aparecida Pinheiro e Camila Botelho Schuck 98 bém, sociológicas nas academias brasileiras, reprodutoras da performance romantizada. Cabe lembrar, nesse sentido, que “Casa Grande e Senzala” foi a primeira obra brasileira a ser classificada na temática Antropologia, sendo considerada uma inovação, visto que anterior a ela, as obras dessa temática eram divididas em Sociologia ou Ciência Política. O complexo convívio no contexto da “casa grande e senzala” é atravessado por forte caldo de “desi- gualdade cordial”, de interditos e não-ditos, cultivando um caldo de cultura, excludente, racista e machista. que se perpetua até nossos dias. Gilberto Freyre vê a contribuição africana como marginal, mas impor- tante. Registra, por exemplo os seguintes locais de representação: Na ternura, na mímica excessiva, no catolicismo em que se deliciam nossos sentidos, na música, no andar, na fala, no canto de ninar meni- no pequeno, em tudo que é expressão sincera de vida, trazemos quase todos a influência negra. Da escrava ou sinhama que nos embalou. Que nos deu de mamar. Que nos deu de comer, ela própria amolengando na mão o bolão de comida. Da negra velha que nos contou as primei- ras histórias de bicho e mal-assombrado. Da mulata que nos tirou o primeiro bicho de pé de uma coceira tão boa. Da que nos iniciou no amor físico e nos transmitiu, ao ranger da cama de vento, a sensação completa de homem. Do moleque que foi nosso primeiro companheiro de brinquedo (FREYRE, 2002, p. 301). Nessa descrição a cultura negra é isolada ao espaço da margem, presa em uma perspectiva colonial de um conto do mito da democracia racial. Percebemos, no excerto acima, que a fala é narrada pela “casa grande”, con- tando ao leitor sua relação com a “senzala”. Neste sentido é que as narrações antropológicas e sociológicas apontam para a retomada de um contexto de apropriação cultural dos sujeitos vistos como a representatividade dos “assu- jeitados das narrativas”. Essa retórica ainda que muito criticada por autores como Fernandes (2005), até hoje permeia o imaginário social brasileiro, reproduzindo a dicotomia permeada por desigualdades. Obviamente que levamos em conta que em 1933, o público leitor da obra provavelmente se identificaria em sua narrativa, sobretudo, a descrição historiográfica da formação do Brasil. Também cabe, neste sentido, conjecturar os elementos desta “casa grande”, a qual segundo o historiador Bert Barickman (2003, p. 82) eram instituídos pelo sistema de caráter patriarcal “com sua estrutura patriarcal, extensa, complexa e poligâmica, seria o melhor exemplo da ‘famí- lia brasileira’ até pelo menos o final do século XIX”.
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