Ecologia Integral: abordagens (im)pertinentes - volume 1

José Roque Junges 80 gra e destrói a preocupação com a preservação daquilo que é comum a todos. Respeito ao comum compreende direitos humanos, bem-estar, segurança e paz social, desenvolvimento e justiça equitativa. A cultura do descarte, típica do capitalismo, é incompatível com o interesse pelo comum, porque leva à re- dução da natureza aos interesses econômicos individualistas. Sem resgate da noção do comum não existe proteção da natureza, como casa comum ou bem comum não apropriável. O capitalismo só entende a lógica da apropriação individualista, expresso no seu princípio fundamental: a propriedade priva- da (LS, 156-158). Nesse momento da pandemia, o comum coletivo, como resposta aos desafios da tragédia sanitária, foi posto à prova, pois o sistema público, esvaziado nas últimas décadas pela priorização do sistema privado de apropriação individual, mostrou-se como mais efetivo e universal na resposta às necessidades da população, mesmo com escassos recursos. O comum engloba as futuras gerações como parte de um destino co- mum, enquanto habitantes do mesmo planeta Terra. Não existe desenvolvi- mento sustentável sem solidariedade intergeracional com o bem-estar das fu- turas gerações, que ainda nem nasceram e estamos deixando para eles, como herança, um ambiente não propício para a reprodução da vida. A terra, como bem e dom gratuito que se recebe e se comunica às próximas gerações, na perspectiva da lógica da recepção e não da apropriação. Entretanto, se não existe solidariedade com os indivíduos da mesma geração, como pode haver solidariedade com as gerações futuras? (LS, 156-162). A lógica da recepção em relação aos serviços da natureza pode trazer aprendizagens para propor saídas para a tragédia da pandemia. Para assumir esta perspectiva integral, Guattari propõe a necessidade de conjugar as três ecologias: a mental (subjetividade humana), a social (relações sociais) e a ambiental (meio ambiente), porque as degradações e as patologias que provocam a crise ambiental acontecem nestes três níveis (GUATTARI, 1990). Essas três ecologias podem servir de ferramentas para entender as exi- gências de transformação sociocultural para que a ecologia integral seja possível. O primeiro desafio para enfrentar a destruição socioambiental é a sub- jetividade humana e o modo como ela está sendo configurada. Trata-se de criticar e desconstruir a subjetivação produzida pelo consumismo a serviço do mercado. O capitalismo, para ampliar seu domínio sobre vida social e cultural, se desterritorializa através de um mercado globalizado sem raiz, in- filtrando-se nos estratos mais inconscientes da subjetividade, subsumindo-a aos seus interesses. Por isso, é importante estar atento aos seus efeitos na ecologia mental da vida quotidiana, pelo consumismo.

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