Ecologia Integral: abordagens (im)pertinentes - volume 1
Afonso Murad 44 Existem muitas diferenças entre os ecossistemas e as comunidades hu- manas. Somente nas comunidades humanas há consciência, justiça e equi- dade. Não podemos aprender nada sobre valores humanos com os ecossiste- mas. O que devemos aprender com eles é como viver de forma sustentável. Esta sabedoria da natureza é a essência da alfabetização ecológica (CAPRA, 2003b, p. 21). Em “A teia da vida”, Capra indica a originalidade da ecologia profun- da. Essa vê o mundo, não como uma coleção de objetos isolados, mas como uma rede de fenômenos interconectados e interdependentes. Reconhece o valor intrínseco de todos os seres vivos e concebe os seres humanos como um fio particular na teia da vida. Capra ainda mostra os liames de deep eco- logy com a sabedoria das grandes tradições religiosas. Em última análise, a percepção da ecologia profunda é percepção espiri- tual ou religiosa. Quando a concepção de espírito humano é entendida como o modo de consciência na qual o indivíduo tem uma sensação de pertinência, de conexidade com o cosmos como um todo, torna-se cla- ro que a percepção ecológica é espiritual na sua essência mais profunda (CAPRA, 2003a, p. 26). A ecologia profunda exige mudanças de percepção, de maneira de pen- sar e de valores a adotar. Mantém a tensão permanente entre autoafirmação e integração, boa e necessária em todos os seres vivos. Corrige os excessos dos valores autoafirmativos (competição, expansão, dominação), típicos da cul- tura ocidental industrial e androcêntrica. Enfatiza a relacionalidade. Ressalta a cooperação, a conservação e a parceria. Tal perspectiva questiona a forma de exercício do poder como dominação sobre os outros. A estrutura ideal para exercer o poder não será mais a hierarquia, mas a rede, que é também a metáfora central da ecologia. A mudança de paradigma implica alteração na organização social, de hierarquias para redes (CAPRA, 2003a, p. 28). “Toda a questão dos valores é fundamental para a ecologia profunda; é, de fato, sua característica definidora central” (CAPRA, 2003a, p. 28). Enquanto que o paradigma anterior se baseia em valores antropocêntricos, centralizados no ser humano, a ecologia profunda está alicerçada em valores ecocêntricos, unificados em torno da Terra. Ela defende a relevância ineren- te da vida não-humana. Todos os seres vivos são membros de comunidades ecológicas interligadas, numa rede de interdependência. Quando essa per- cepção ecológica profunda se torna parte de nossa consciência cotidiana, aflora um sistema ético radicalmente novo, caracterizado pelo cuidado. “Se
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