Ecologia Integral: abordagens (im)pertinentes - volume 1

Ecologia integral: um novo paradigma 27 A consciência de que “tudo está em relação” constitui uma espécie de leitmotiv que retorna sempre no decorrer da encíclica. Nesse sentido, além de ser pressuposto de tudo quanto se afirma no decorrer da mesma, essa consciência é explicitada em pontos cruciais do discurso do papa. A afirma- ção de que tudo está em relação, com pequenas variações, recorre com fre- quência ao longo da encíclica. Já na introdução, o papa Francisco reconhece o sentimento de pertença que une todas as criaturas entre si. Escreve ele: Crescemos pensando que éramos seus proprietários e dominadores, au- torizados a saqueá-la. [...] Esquecemo-nos de que nós mesmos somos terra (cf. Gn 2,7). O nosso corpo é constituído pelos elementos do planeta; o seu ar permite-nos respirar, e a sua água vivifica-nos e restau- ra-nos (LS, 2). Compreende-se, portanto, o apelo do papa não apenas aos cristãos, mas a todos os cidadãos do planeta, autênticos “filhos da terra”. Esse apelo é pela aliança entre os vários saberes da sociedade: entre as ciências e as reli- giões, entre as culturas dos povos originários e do povo em geral, incluindo a arte e a poesia, a vida interior e a espiritualidade. O papa Francisco formula esse apelo já nos primeiros parágrafos da Laudato Si’ , nos seguintes termos: Lanço um convite urgente a renovar o diálogo sobre a maneira como estamos a construir o futuro do planeta. Precisamos de um debate que nos una a todos, porque o desafio ambiental, que vivemos, e as suas raízes humanas dizem respeito e têm impacto sobre todos nós (LS, 14). 2.2. Uma nova epistemologia: reconhecer, compreender e curar O papa tem consciência de que vivemos em uma civilização extre- mamente complexa. Reiteradas vezes ele se refere a uma interconexão que atravessa a totalidade dos fenômenos. E a consequência é que se torna cada vez mais difícil captar as questões do “nosso tempo”, que se revelam sempre mais, em seu caráter multidimensional, com um saber compartimentado e uma lógica linear. A agravar ainda mais a situação é a condição de indigência do pensamento do qual nos tornamos reféns. O papa parece deflagrar uma inadequação entre o saber e a realidade. A fragmentação do nosso saber oci- dental hegemônico é incapaz de compreender “o que está tecido em conjun- to”, o que é complexo ( cum + plexus ), segundo a etimologia do termo. Por essa razão, ele propõe um novo paradigma epistemológico que seja inclusivo em seu modo de conhecer. Em vez de adotar a disjunção ou a redução como

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