André Luiz Olivier da Silva 94 razão disso, legisladores se mobilizam para tipificar, com penas mais severas, ações que, se muito, podem ser reprovadas do ponto de vista moral ou até mesmo religioso, mas não do ponto de vista jurídico. Passam a legislar para reprimir com o direito penal – e, muitas vezes, com a prisão – o uso de drogas, o aborto e a eutanásia, dentre outras ações que passam a ser vistas como suspeitas pelo ordenamento jurídico. O mesmo ocorre com os magistrados que se deixam influenciar pela sanha punitivista e conduzem o direito a invadir uma seara que não é a sua. Por meio de decisões judiciais, magistrados querem, então, resolver problemas que só podem ser selecionados no campo da moralidade. Passam a produzir, na atividade jurisdicional, mais moralismo e paternalismo, mais encarceramento em massa, mais violência, mais danos contra os apenados e, principalmente, contra a sociedade. Aliás, é importante destacar que a intervenção do estado a partir do direito penal – e, para ser mais explícito, a partir da pena de prisão – só faz multiplicar os danos e as violações de direitos humanos, ao ponto que poderíamos concluir pela inutilidade da pena privativa de liberdade e da punição como um todo. Qual é, afinal, a utilidade de se punir e constranger a liberdade se o resultado dessa intervenção estatal implica em mais prejuízo ainda do que o dano que foi praticado? Qual é a serventia da punição e, por consequência, da pena criminal quando diante de crimes que não provocam danos contra terceiros? O fato é que não faz sentido criminalizar e punir determinados comportamentos. Para tornar isso mais claro, filosoficamente, é imprescindível o estabelecimento de uma linha de corte para separar o direito penal da moralidade e essa linha gira em torno do princípio do dano, em especial o dano contra terceiros, visto que o direito penal só pode ser a última ratio quando houver dano provocado contra algum bem jurídico, como pessoas e propriedades, contra quem, no mais das vezes, não tem nada a ver com a conduta praticada. O antídoto contra o veneno do moralismo legal imbuído de paternalismo que penetra nos usos que juristas e legisladores fazem do direito penal para punir e aplicar a pena de prisão é a constituição de um direito penal mínimo, com a mínima interferência na esfera individual de liberdade dos cidadãos. O jus puniendideve ser limitado por direitos e garantias individuais, e não o contrário. As liberdades individuais só devem sofrer constrangimento e restrição quando provocarem danos
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