Sistema do direito, novas tecnologias, globalização e o constitucionalismo contemporâneo: desafios e perspectivas

93 O uso moral e paternalista do Direito Penal: desafios do punitivismo jurídico... pressupor que o direito penal serve para reprimir comportamentos que são moralmente errados, maléficos e reprováveis, como o homicídio, o estupro ou qualquer outro tipo de violência física dolosa. Afinal de contas, esse tipo de conduta é reprovável tanto do ponto de vista moral quanto da perspectiva jurídica. No entanto, a relação entre moralidade e direito penal é perniciosa porque o que se verifica, na prática, é o uso moralista do direito penal, o uso da criminalização de condutas e do sistema de penas para punir e infligir castigo por atos praticados que, em muitas ocasiões, não provocam danos contra terceiros. Se muito, esses atos provocam danos contra o próprio autor da conduta, que é, a um só tempo, autor e vítima do crime cometido. Se quiséssemos prosseguir desdobrando o tema da punição de condutas e comportamentos que não provocam danos a terceiros, chegaríamos no tópico da justificação das penas, que é um tópico para o qual fica muito evidente o uso moral e paternalista do direito penal. Primeiramente, porque as teorias justificadoras da pena, seja com o retributivismo, seja com o prevencionismo, revelam uma forte crença no direito penal. Uma crença de que o direito penal pode ajustar todo tipo de comportamento que a sociedade venha a considerar como indesejável ou até mesmo reprovável. Neste ponto, é sempre prudente reservar uma postura cética em relação à execução e ao cumprimento de penas Em segundo lugar, é preciso observar que legisladores e juristas, sem falar na mídia e no senso comum veiculado pelas redes sociais, costumam, aparentemente, preferir a criminalização de condutas do que qualquer outra modalidade de interferência estatal nas liberdades individuais, como se o direito penal fosse o método mais eficiente para resolver problemas sociais, morais e políticos, do que as outras áreas do direito, como o direito administrativo, por exemplo. Parece que há uma preferência por usar o direito penal como a melhor técnica de controle social, em aumentar a massa carcerária, em apostar no direito penal como solução de todos os problemas. Há uma crença cega no direito penal, no sentido de que a criminalização de condutas e a prisão possam garantir a coesão social. Além disso, a perspectiva do senso comum é fortemente retributivista e compartilha da tese de que ao mal causado deve ensejar o mesmo mal. O senso comum quer a punição severa dos criminosos, mesmo quando esta punição não se apresenta como um instrumento útil. Em

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