André Luiz Olivier da Silva 82 penal e moralismo jurídico. Pretende-se mostrar, primeiramente, que o princípio do dano é um balizador para se compreender que o direito penal só deve ser convocado a atuar para criminalizar pouquíssimas condutas e comportamentos, a saber, aquelas que realmente são graves e provocam violência. Se determinada conduta não provoca danos contra terceiros, então, ela não deve ser criminalizada e nem sofrer sanções na esfera criminal. A partir desta hipótese, pretende-se, em seguida, apontar para o uso moral e paternalista que se faz do direito penal para restringir liberdades individuais. No âmbito do direito penal, o moralismo legal consiste em criminalizar condutas que provocam não mais do que ofensas morais, enquanto o paternalismo legal consiste na criminalização de condutas que provocam danos apenas ao seu próprio agente. Ao final do trabalho, pretende-se propor uma perspectiva minimalista do direito penal, pautada em direitos fundamentais e em direitos humanos, no sentido de que a punição criminal não deve ser usada para corrigir comportamentos reprováveis apenas de um ponto de vista moral. Propõe-se, ainda, um longo processo de descriminalização de condutas que hoje são consideradas crimes, mesmo sem provocar danos contra terceiros. O direito penal não se presta a resolver problemas que devem ser enfrentados por meio de políticas públicas em outras áreas, como a saúde e a educação – e é isso o que se pretende concluir ao final da argumentação. 2. Punição e constrangimento da liberdade Costuma-se dizer que o Brasil é o país da impunidade. Talvez essa afirmação até possa fazer sentido e ser verdadeira no que tange aos crimes contra a vida. No entanto, no que se refere aos crimes que, de modo direto ou indireto, envolvem o patrimônio, essa afirmação é falsa, visto que o Brasil não só pune em demasia como também pune muito mal os seus criminosos. A esse fenômeno podemos nos referir com termos e expressões tais como “punitivismo”, “expansão do direito penal”, dentre outras expressões que mostram a distorção no uso dos tipos penais e do próprio sistema de penas que se molda e deforma dentro de ordenamentos jurídicos, como no caso do Brasil e de tantos outros países das Américas – incluindo nesta lista os Estados Unidos, o país que mais encarcera no mundo.
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