Sistema do direito, novas tecnologias, globalização e o constitucionalismo contemporâneo: desafios e perspectivas

73 O constitucionalismo de Angola e a sua Constituição de 2010 Mas essa é uma conclusão que se pode também testar pela leitura do próprio articulado da CRA, que mantém todas as características que já existiam no texto da LCRA de 1992. A multiplicação de preceitos constitucionais da nova CRA em relação à LCRA revela mais do foro do aprofundamento regulativo de certos institutos e da adição de mais direitos e liberdades do que propriamente de uma intenção de romper com o regime constitucional pré-existente. E mesmo quando as mudanças foram de maior monta, como a passagem de um sistema de governo semipresidencial a presidencial, não se operou qualquer rotura na ordem constitucional porque essa matéria nunca esteve protegida ao nível dos limites materiais de revisão constitucional. VII. Uma questão que se pode colocar tem a ver com a natureza do poder jurídico-público que, no plano parlamentar, segregou a nova CRA de 2010. É que, na Teoria do Direito Constitucional, só tem sentido falar-se de Constituição quando a mesma resulta de um poder constituinte, poder prototípico do Estado, qualquer que ele seja. Se a nova Constituição de Angola de 2010 não inovou em relação à Lei Constitucional de 1992, não tendo surgido um poder constituinte com a virtualidade de estabelecer uma outra identidade constitucional, então só haveria que se contestar a designação de “Constituição” que foi dada ao articulado aprovado pela Assembleia Nacional em fevereiro de 2010. Note-se que este problema não se coloca apenas em Angola: no espaço africano de língua portuguesa, já em Moçambique sucedeu algo de semelhante, com a aprovação de uma nova Constituição em 2004, a qual não inovou substancialmente em relação à Constituição de 1990, essa, sim, um dos elementos fundadores da II República Moçambicana. (GOUVEIA, 2015, p. 119 e ss.) É de crer que, apesar de tudo, é mais apropriado apelidar de “Constituição” o texto angolano de 2010 do que o texto moçambicano de 2004, por um simples motivo: é que, em Angola, a Lei Constitucional de 1992 nunca se assumiu como um texto constitucional definitivo, até tendo evitado a nomenclatura “Constituição”, usando uma designação menos comprometida e mais adequada a essa transitoriedade, ao

RkJQdWJsaXNoZXIy MjEzNzYz