287 O desenvolvimento tecnocientífico e a questão bioética dos limites das novas tecnologias todas as circunstâncias que fazem parte das nossas ações. A introdução desta exigência relativa às circunstâncias da ação é necessária para a verdade do julgamento damedietas. Podemos assim concluir que este julgamento não é uma mera tautologia, o qual se deixaria revelar por uma simples análise dos seus termos. No entanto, ele não é um julgamento tal como os demais julgamentos práticos, como aqueles que comandam a realização de alguma ação (pagar os impostos, por exemplo) ou de não realização uma determinada ação (não roubar, por exemplo). O que este tipo de julgamento nos explicita é que fazer isto ou aquilo tem um limite, a saber, os limites que nos são impostos pelas circunstâncias da ação humana. Dessa forma, depois de salientar que os julgamentos práticos encontram um limite nas circunstâncias em que se desenvolvem as nossas ações, Tomás de Aquino pergunta se existiriam certas ações que escapariam a esta métrica do justo meio? Para responder a esta questão, ele se refere a um texto fundamental daÉtica a Nicômacode Aristóteles: Mas nem toda ação e paixão admitem um meio-termo, pois algumas têm nomes que por si mesmos implicam maldade, como o despeito, o despudor, a inveja, e, no campo das ações, o adultério, o furto, o homicídio. Todas estas coisas e outras semelhantes implicam, nos próprios nomes, que são más em si mesmas, e não o seu excesso ou deficiência. Nelas jamais pode haver retidão, mas unicamente erro (ARISTOTLE, 1959, p. 9-15, tradução nossa). A admissão deste tipo de julgamento prático significa simplesmente que existem ações que ficam numa extremidade (excesso) ou em outra (falta) e estão sempre desviadas do que devemos fazer nestas ocasiões. As considerações sobre as circunstâncias onde se produzem as ações não são mais objeto de análise, isto é, elas não são mais relevantes para a determinação da qualidade moral de nossas ações. Deste modo, estas ações são nomeadas por Tomás de Aquino como intrinsecamente más9 ( absolutus, absolute ou malum in se ) (JONSEN; TOULMIN, 1988, p. 262) . Esta tese valeria somente para descrições com um alto grau de abstração, abstração feita de todas as circunstancias. Assim, “matar um homem inocente” é geralmente um mal, mas não intrinsecamente, pois poderíamos estar diante de um caso de 9 “ malum in se” , cf. S. Pinckaers (1986).
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