Gerson Neves Pinto 284 analogias com outros casos. É uma perspectiva de análise centrada em insights (discernimentos) particulares acumulados no curso da experiência concreta. Ao reunir casos paradigmáticos, o casuísta cria uma plataforma comum de comparação e contraste. Segundo os partidários do método casuístico, o que importa não é possuir princípios universais que, associados à descrição de casos, permitiriam deduzir não somente o que deveríamos fazer, mas ter uma taxonomia de situações éticas de base (os paradigmas) aos quais comparamos a situação à qual estamos confrontados. Por exemplo, a morte, isto é o ato moralmente condenável de matar intencionalmente um ser humano inocente5 constitui-se num paradigma. Quando estamos em presença de um homicídio, a questão é então de saber se é um caso de homicídio ou qualquer outra coisa (uma legítima defesa, uma negligencia, um acidente, um suicídio uma execução, etc.) a qual deveremos, sem dúvida, julgar moralmente e juridicamente de modo diverso. Uma primeira e clássica taxonomia concerne à teoria das virtudes de Aristóteles. Assim, a casuística reivindica uma herança do aristotélico-tomismo. E no que concerne à bioética6 , nós percebemos que os filósofos e os juristas adotam facilmente o principialismo, ao passo que a ética clínica é quase necessariamente casuística. A censura que fazem os partidários deste ultimo método ao principialismo é que ele não é suficientemente preciso para dar conta da complexidade dos casos particulares encontrados na prática. Para tanto, devemos considerar que, na teoria das virtudes, cada virtude representa um paradigma que serve de medida para apreciar os caracteres reais dos casos práticos e suas circunstancias. As circunstancias ( circum-stare ) – literalmente, o que está à volta – foram estudadas por Aristóteles e retomadas por um retórico anônimo medieval através da composição de um hexâmetro que as reuniu a fim de ajudar os alunos a memorizá-las: qui, quoi, ubi, quibus auxiliis, cur, quomodo, quando, isto é, quem, o que, onde, por quais meios, por que, como, quando. A leitura desta lista confirma que a casuística é bem diferente do principialismo (JONSEN; TOULMIN, 1988, p. 132) . Levar a sério as circunstancias, é como afirma Jean-Yves 5 Tomás de Aquino, suma teológica, II-II, q. 64, a. 6: “Logo, de nenhum modo é lícito matar um inocente”. 6 Neste ponto, seguindo os ensinamentos de Jonsen e Toulmin, tentaremos reconstruir os fundamentos epistemológicos que a tradição forneceu para a bioética enfrentar os novos dilemas da contemporaneidade.
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