Dominique Rousseau 178 gastada, o sentido deste constitucionalismo está sendo questionado. A primeira razão resulta das modificações do equilíbrio entre as propriedades da constituição. No século XVIII, a separação dos poderes era a propriedade prioritária de modo a conferir o seu sentido à noção de constituição: uma constituição é a determinação da separação dos poderes. A terceira propriedade, a garantia dos direitos e liberdades dos cidadãos, não é decerto olvidada, no entanto, não estava amparada por nenhum mecanismo de proteção, já que é considerada como a consequência necessária da limitação dos poderes, obtida pela divisão destes: tudo estaria perdido, escreve Montesquieu, “se o mesmo homem, ou o mesmo corpo dos principais, ou dos nobres, ou do povo exercesse os três poderes: o de fazer as leis, o de executar as resoluções públicas e o de julgar os crimes ou as querelas entre os particulares”. Aos poucos, esta propriedade perderá força e autoridade em decorrência das práticas políticas, as quais demonstraram que, independentemente da organização política estabelecida, a lógica eleitoral majoritária acabou por concentrar os poderes legislativo e executivo nas mãos do chefe do Executivo, quer este seja Presidente da República, como na França, ou Primeiro-Ministro, como na Espanha, na Alemanha ou no Reino Unido. Neste contexto, a constituição-separação dos poderes deixa de ser o meio de garantir a democracia e a liberdade política dos cidadãos. Este relativo aniquilamento ensejou a ascensão da terceira propriedade, a garantia dos direitos, propiciando o surgimento de uma instituição destinada a garantir o respeito destes direitos: a jurisdição constitucional. Tendo em vista que o mecanismo da separação dos poderes não logrou êxito, relativamente à proteção dos direitos, esta proteção passou a ser garantida por meio de um mecanismo especial, o controle jurisdicional da constitucionalidade das leis, quer seja a possibilidade de um juiz sancionar as violações dos direitos constitucionais pelo legislador. A constituição, que traz no seu bojo a democracia, não corresponde mais a esta constituição que garante os direitos fundamentais por meio da separação dos poderes, mas, sim, a esta constituição que os garante por meio do controle de constitucionalidade; não se trata mais da constituição-separação dos poderes, mas da constituição-direitos fundamentais. Além deste primeiro deslocamento “interno” relativo à reestruturação das propriedades da noção de constituição, há de se destacar um segundo, “externo”, relativo ao “alvo” da constituição”. No século
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