Futuro com ou sem agrotóxicos: impactos socioeconômicos globais e as novas tecnologias

Agrotóxicos e o controle de riscos às gerações atuais e futuras pela aplicação prudente... 55 16). Sob tal perspectiva, pode-se afirmar que a intensa utilização de agrotóxicos na produção de alimentos contribui para uma sociedade que se caracteriza pela “sim- biose entre o desenvolvimento de novas tecnologias com a produção de riscos que quando se manifestam causam graves danos à saúde e à vida humana” (RIBEIRO; GUSMÃO; CUSTÓDIO, 2018, p. 21). Os parâmetros de segurança fixados para variadas atividades no contexto da sociedade de risco, tais como aqueles estabelecidos para evitar casos de into- xicação aguda e crônica por exposição a resíduos de agrotóxicos, “assemelham-se a um jogo de apostas, numa espécie de loteria às avessas que ameaça a dignidade das presentes e futuras gerações” (GUSMÃO, 2018, p. 21). Assiste razão a Beck, ao ponderar que ao intentar calcular e controlar o risco dentro de um cenário de incerteza decorrente de limitações verificadas no estado da técnica, a racionalidade científica “baseia-se, por um lado, num castelo de cartas de conjecturas especulativas e move-se unicamente no quadro de asserções de probabilidade ” (BECK, 2011, p. 35, grifo no original). Além de decorrer de limitações da ciência, a incerteza quanto ao risco tam- bém pode se originar da simples ausência de estudos científicos sobre determinada questão ou por sua falta de profundidade quando realizados, a exemplo do que ocorre naqueles em que se percebe uma manifesta insuficiência de amostras cole- tadas. Esta última situação pode ser extraída dos fundamentos e conclusões conti- dos no Programa de Análise de Resíduos de Agrotóxicos (PARA), publicado pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) em 2016, com pretensão de averiguar os riscos de intoxicação pela dieta. No aludido estudo, em que se pretendia averiguar o nível de segurança alimentar do consumidor brasileiro, foram analisadas apenas 12.051 amostras de 25 tipos de frutas, verduras e legumes, de modo que diversos tipos de alimentos que também possuem resíduos de agrotóxicos não foram avaliados – outras frutas, verduras e legumes, além de carnes, ovos, leite, etc. (ANVISA, 2016, p. 5). Além de limitação de amostras, não se analisou a presença de resíduos do glifosato e do 2,4-D, que são dois ingredientes ativos que compõem herbicidas intensamente utilizados pelo setor agrícola brasileiro, em especial na sojicultura, sob o argumen- to de que se faria necessário adotar uma metodologia específica, o que acarretaria em sobrecarga da rotina laboratorial (ANVISA, 2016, p. 21). Evidencia-se, portanto, uma situação de incerteza provocada por risco la- tente, resultante do modelo de produção agrícola oriundo da Revolução Verde, em ameaça não apenas ao meio ambiente, à saúde e à vida das atuais e futuras gerações, mas também à própria capacidade produtiva das terras hoje cultivadas. Com razão, Gliessman pontua que “Todas as práticas da agricultura convencional tendem a comprometer a produtividade futura em favor da alta produtividade no presente” (GLIESSMAN, 2009, p. 40). São diversos os meios pelos quais os resíduos de agrotóxicos utilizados pela agricultura podem contaminar o meio ambiente e expor seres humanos a riscos de intoxicação aguda e, principalmente, crônica. Desde a aplicação do produto em si, passando pelo descarte de embalagens vazias que ainda permanecem impreg- nadas de resíduos, até o consumo de água e de alimentos.

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